a partir de maio 2011

terça-feira, 15 de abril de 2014

Adaptação: uma dificuldade do homem

O ser humano é defensivo contra tudo aquilo que constitui uma ameaça ao seu equilíbrio interior
 •  José Luiz Condotta

Nos animais inferiores, o instinto dá possibilidades de adaptação a certas situações bem definidas, mas esta adaptação só pode variar dentro de estreitos limites. Nos animais superiores, revelam-se possibilidades mais complexas; e, no homem, com a inteligência desenvolvida, as respostas de adaptação são mais matizadas, portanto bem mais complexas. 
Todo ser vivo tende a assimilar o mundo que o rodeia ao seu organismo, aos seus esquemas de ação e, no caso do homem, também aos seus esquemas de pensamento.
A inteligência humana não é fator único do modo de adaptação a uma situação. O dinamismo, a flexibilidade mental, o equilíbrio afetivo e a harmonia que reinam no seio da personalidade constituem um todo.
O homem, corpo e alma, espírito encarnado neste mundo, é sabedor que está aqui por provas ou por expiações e, por isto, deverá enfrentar uma série de dificuldades, todas elas para o bem da sua evolução. Deve ser inteligente o bastante para esse enfrentamento sem se desequilibrar a ponto de se tornar portador de um transtorno qualquer, seja ele físico ou psíquico, embora estes estejam constantemente interligados. É notório que todo ser humano necessita e, por isto se utiliza, de uma defensiva na luta contra aquilo que o ameaça na sua homeostase, ou seja, no seu equilíbrio interno.
Na psiquiatria e psicologia, o transtorno de adaptação é um diagnóstico e pode ser definido como um estado de desequilíbrio do funcionamento psíquico e orgânico que ocorre quando o organismo necessita utilizar seus recursos psicobiológicos para lidar com eventos que exijam uma ação defensiva. É um estado de sofrimento e de perturbação emocional que ocorre no curso de um período de adaptação a uma mudança existencial importante ou a um acontecimento estressante. Geralmente, entrava o funcionamento e o desempenho social de seu portador. Tem como característica essencial uma reação depressiva ou outra perturbação da emoção e da conduta que, quando persiste além de um período de três meses do evento, permite considerar-se instalado o transtorno, segundo o CID-10(1).
Podemos assim dizer que a adaptação está relacionada com o meio ambiente como um todo. É a ação pela qual o homem se ajusta a esse meio em que vive, conciliando as suas tendências com os seus deveres e com as limitações que lhe são impostas por esse mesmo meio.
Para uma efetiva adaptação, é necessária a assimilação dos eventos, que nada mais é que a busca dentro de si das suas capacidades inatas (tendências), da sua potencialidade para o bem, utilizando, através das forças anímicas, os pensamentos e sentimentos de paciência, perseverança, resignação e esperança. É um processo dinâmico porque visa estender a esfera de ação, mas também conservador porque visa manter a sua estrutura em equilíbrio. 
Outro modo de adaptação que muitas pessoas utilizam é a acomodação, deixando que o meio ambiente domine, e acabam aceitando tudo o que lhes é imposto. A tendência para fazer predominar um ou outro destes dois modos de adaptação explicaria a variedade de condutas observadas.
Utilizando um ou outro modo de adaptação, o objetivo visado é o equilíbrio psicofísico e social. O homem equilibrado é aquele que dá a cada coisa a devida importância no conjunto de dados que o rodeiam. É aquele capaz de se adaptar com facilidade às variações do meio, quer de forma automática visando a sua harmonia interna, quer de forma refletida, por exemplo resolvendo os problemas que se lhe apresentam. 
Observemos que, no decorrer do assunto, citamos alguns fatores que necessitam de atenção. Vejamos: a inteligência como fator importante na adaptação; a reflexão dos estímulos recebidos que leva à assimilação, desta fluindo a qualidade dos pensamentos e sentimentos. Todos esses fatores – inteligência, reflexão, sentimentos e pensamentos – são produtos do espírito. Logo, sem dúvida, a adaptação a novas situações requer a efetividade da alma.
Na prática psiquiátrica, costumamos deparar com a falta de adaptação na grande maioria dos transtornos emocionais. Por exemplos: um sujeito que perde um ente querido e encontra dificuldade para assimilar e adaptar-se a essa perda; outro que tem dificuldade para assimilar uma situação no emprego, sentindo-se inadaptado; uma criança que não consegue adaptar-se a uma turma nova da escola; um indivíduo que, mesmo após anos, não consegue uma boa adaptação com a vida matrimonial; enfim, uma série das mais variadas situações causadoras de sintomas emocionais que, na verdade, encobrem a evidente falta de adaptação.
Quando esse estado de inadaptação torna-se permanente, aparecem sintomas emocionais dos mais diversos: humor depressivo, ansiedade, sentimento de incapacidade frente às novas situações, insônia e muitos outros, podendo chegar a sintomas físicos ocasionados pela somatização das emoções.
Segundo Kardec(2), “o Espírito, na sua programação reencarnatória escolhe o gênero de provas que quer suportar, utilizando o seu livre-arbítrio. Pode escolher uma que esteja acima das suas forças, então, sucumbe; pode também escolher uma que não lhe dê proveito algum”. Esses ensinamentos nos levam a um questionamento plausível: não haveria porventura uma desadaptação configurada na escolha das provas de um Espírito que já reencarna comprometido? Supomos que sim. Da escolha idealizada à prática dessa escolha para a nova vida existe uma distância. A escolha exige-lhe eventualmente, para cumpri-la, uma luta intensa contra as poderosas forças dos estímulos ambientais (tentações), que podem contaminar o Ego, acarretando um conflito entre as duas forças (inconsciente – da alma, e consciente – do plano físico) determinando a desadaptação. Neste caso, o equilíbrio dessas forças é imprescindível na adaptação.
Pela óptica espírita, todo ser humano se adapta ou não a todas as situações existenciais com seu corpo e com sua alma. Recebe, com o corpo, os estímulos do ambiente; a alma, após percebê-los, refleti-los e assimilá-los, gera pensamentos e sentimentos e devolve-os ao corpo físico para exteriorizá-los em ação. Fica nítida, mais uma vez, a presença efetiva da alma no processo de adaptação.
Temos uma consciência originada dos arquivos do inconsciente, que é a somatória de todas as nossas vivências. Toda a nossa ação comportamental, pela visão reencarnacionista, nos remete a deduzir que a dificuldade de adaptação nesta nova vida tem a causa profunda no passado do espírito, quando ainda ficaram pendentes muitas questões a serem resolvidas. Por isto que a dificuldade de adaptação pode ser observada em todos os setores da vida, desde a inadaptação com o próprio corpo até com os estímulos mais banais. Como exemplos, podemos citar a desadaptação devida à cor da pele, à altura, ao peso, ao comportamento sexual, à família, a pessoas difíceis, à condição financeira, à profissão etc., muitas vezes induzindo em uns o desenvolvimento de um complexo de inferioridade e em outros uma ação preconceituosa que não deixa de ser uma dificuldade de adaptação.
A história do sujeito em fase de desadaptação requer uma visão mais profunda para que se encontre uma ajuda efetiva. Não se pode cuidar somente dos efeitos sem o estudo da causa. André Luiz(3) refere a isto da seguinte maneira: “A Medicina terrestre, no futuro, para atender com eficácia ao doente, examinar-lhe-á com minúcias a sua feição espiritual”.
Para uma boa adaptação na vida que cada um tem, na maioria das vezes escolhida pelo próprio espírito na programação reencarnatória, necessário se faz viver dentro das leis de Deus, sem porém repelir as satisfações que o mundo oferece, dentro das leis desse plano material. É necessário também o conhecimento que leva o ser a se alinhar com o seu papel nesta vida e a descobrir novos meios de ação. Em outras palavras, procurar manter o equilíbrio psicofísico-espiritual, lembrando sempre que o ensinamento espírita é de equilíbrio em tudo e por tudo. 

1. CID-10 - Classificação Internacional de Doenças. Décima revisão, diagnóstico F 43.2.
2. KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Trad. Salvador Gentile. Araras: IDE, 2006. Questões 258 e 269.
3. XAVIER, Francisco Cândido; VIEIRA, Waldo. Sexo e destino. Pelo Espírito André Luiz. Rio de Janeiro: FEB, 2007. p. 26.

http://oclarim.org/site/

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