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domingo, 28 de abril de 2019

Alma gêmea


A ideia mística de alma gêmea, ou cara-metade, diz respeito a uma teoria mística que propõe que cada alma (Espírito) tem, desde sua origem, uma ligação íntima e direta com um determinado semelhante com quem está fatalmente predestinado a se encontrar e então compartilhar a relação de mútuo afeto — comumente associado à paixão carnal —, um completando ao outro, pelo resto da infinidade dos tempos. A Doutrina Espírita refuta essa ideia, mediante o princípio de indivisibilidade de cada ser, bem como por revelar o verdadeiro caráter das ligações espirituais (que são desprovidas de paixões e interesses materiais) do que resulta que os Espíritos perfeitos (aqueles que completaram o curso evolutivo) formam uma fraternidade universal, em que todos — e não um mero par — se afeiçoam uns aos outros de igual maneira, como irmãos, tendo todos igualmente filhos de Deus.
Ver Alma.

Conceito de gêmeo
O termo gêmeo vem do latim gemìnus têm quatro concepções diversas: 1) duplo, duplicado; 2) igual, semelhante, parecido; 3) corpulento; e 4) intenso. O misticismo reuniu os quatros níveis de significados para elaborar a tese de que um ser (alma ou Espírito) é na verdade uma dualidade (dois seres que podem estar separados, mas que estão destinados a se unirem e se completarem) de dois seres muito semelhantes em sua essência íntima, embora se figurem numa polaridade física (um no corpo de homem e o outro no de mulher) cujo destino é a união, para viverem essa intimidade intensamente.

Refutação espírita
Segundo o Espiritismo, cada Espírito é uma individualidade e, sendo indivisível, a alma não pode estar sujeita a outra, nem tampouco ser completada. Embora conservem a individualidade, todos são criados semelhantes e todos destinados a uma igualdade, não havendo parelhas particulares.
Os Espíritos se simpatizam, se atraem e se ligam verdadeiramente uns aos outros por sentimentos, não por laços materiais ou outra força qualquer. No curso evolutivo, aqueles que compartilham dos mesmos desejos e instintos atraem-se e, inclusive, costumam se habilitar para compartilharem de múltiplas experiências reencarnatórias juntos — como cônjuges, irmãos, amigos etc.
As atrações particulares entre as almas são relativas ao seu grau evolutivo. Porém, uma vez que alcancem a perfeição espiritual, largam as particularidades e se entrelaçam pelo princípio da fraternidade universal, em que somos todos irmãos, todos filhos de Deus, destinados ao amor universal (O Livro dos Espíritos, questões 298 a 303).
"A teoria das metades eternas [almas-gêmeas] é uma simples figura de linguagem, representativa da união de dois Espíritos simpáticos. Trata-se de uma expressão usada até na linguagem vulgar e que não devemos tomar ao pé da letra. Certamente, os Espíritos que a empregaram não pertencem a uma ordem elevada. Necessariamente, limitado sendo o campo de suas ideias, exprimiram seus pensamentos com os termos de que se teriam utilizado na vida corporal. Não se deve, pois, aceitar a ideia de que, criados um para o outro, dois Espíritos tenham, fatalmente, que se reunir um dia na eternidade, depois de haverem estado separados por tempo mais ou menos longo."
Allan Kardec, O Livro dos Espíritos - comentário à questão 303

Controvérsia
Uma importante opinião no meio espírita controversa a esse tema é a do Espírito Emmanuel, guia espiritual de Chico Xavier. Na obra Há Dois Mil Anos, 1ª Parte, capítulo IV, psicografada por Chico Xavier e publicada em 1939, pela qual narra sua aventura terrena, encarnado como o senador romano Públio Lentulus, encontra-se o poema seguinte, que ele dedica para sua amada esposa Lívia:
Alma gêmea da minh'alma,
Flor de luz da minha vida,
Sublime estrela caída
Das belezas da amplidão!...
Quando eu errava no mundo 
Triste e só, no meu caminho,
Chegaste, devagarinho,
E encheste¬-me o coração.
Vinhas na bênção dos deuses,
Na divina claridade,
Tecer¬-me a felicidade,
Em sorrisos de esplendor!...
És meu tesouro infinito,
Juro¬-te eterna aliança,
Porque eu sou tua esperança,
Como és todo o meu amor!
Poderíamos supor a menção "alma gêmea da minh'alma", exposta já no primeiro verso, apenas como uma figura de linguagem, ou mesmo a crença daquele personagem, inclusive porque o poema também faz menção aos deuses romanos (primeiro verso da segunda estrofe). Porém, não seria comum pensar esta ser a crença do Espírito Emmanuel, guia espiritual do referido médium. No entanto, um ano depois é lançado o livro O Consolador, do mesmo autor e pelo mesmo psicógrafo, no qual Emmanuel parece validar a tese de almas gêmeas:
"No sagrado mistério da vida, cada coração possui no Infinito a alma gêmea da sua, companheira divina para a viagem à gloriosa imortalidade. Criadas umas para as outras, as almas gêmeas se buscam, sempre que separadas. A união perene é-¬lhes a aspiração suprema e indefinível (…) 
A ligação das almas gêmeas repousa, para o nosso conhecimento relativo, nos desígnios divinos, insondáveis na sua sagrada origem, constituindo a fonte vital do interesse das criaturas para as edificações da vida. Separadas ou unidas nas experiências do mundo, as almas irmãs caminham, ansiosas, pela união e pela harmonia supremas, até que se integrem, no plano espiritual, onde se reúnem para sempre na mais sublime expressão de amor divino, finalidades profundas de todas as cogitações do ser, no Dédalo do destino."
Emmanuel, O Consolador - psicografia de Chico Xavier, questões 323 e 325

Com a questão adiante, desta mesma obra, Emmanuel cria certa ambiguidade ao afimar que "O amor das almas gêmeas não pode efetuar semelhante restrição, porquanto, atingida a culminância evolutiva, todas as expressões afetivas se irmanam na conquista do amor divino. O amor das almas gêmeas, em suma, é aquele que o Espírito, um dia, sentirá pela Humanidade inteira."
De qualquer maneira, prevalecendo a opinião geral, a Doutrina Espírita refuta a ideia de alma gêmea, atesta a indivisibilidade do Espírito e a destinação comum para todos em vista da fraternidade e do amor universal.

Referências
  • O Livro dos Espíritos, Allan Kardec - especialmente: "Introdução ao estudo da Doutrina Espírita"; Parte 2ª: "Do mundo espírita ou Mundo dos Espíritos" (questões 76 a 613).
  • Há Dois Mil Anos... (Emmanuel) Francisco Cândido Xavier- especialmente 1ª Parte, cap. IV: "Na Galileia".
  • O Consolador, (Emmanuel) Francisco Cândido Xavier- especialmente 3ª Parte, 3: "Amor, União" (questões 322 a 331).

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