a partir de maio 2011

sábado, 11 de agosto de 2012

Justiça humana e justiça divina

por Henri Barreto
A legislaçãoii escrita está baseada na ética e moralidade humana e sua justiça tem um sentido social e corretivo, por isso mesmo, sofrendo variações de conformidade com o tempo e local; já a lei e a justiça Divina persistem eternamente porque a sua instância não está restrita ao espaço e ao tempo, ela é individual e inerente ao Espírito. Conforme O Evangelho segundo o Espiritismo (EVSE)1, as leis humanas possuem certas falhas e as pune de acordo (“in acordem”) com o prejuízo da sociedade e não conforme suas consequências íntimas ou morais. Nas questões 875 e 876 de O Livro dos Espíritos (LE)2, Allan Kardec questiona: Como se pode definir a justiça? – A justiça consiste no respeito aos direitos de cada um. Kardec insiste: O que determina esses direitos? – São determinados pela lei humana e a lei natural. Kardec ainda pergunta: Fora do direito consagrado pela lei humana, qual a base da justiça fundada sobre a lei natural? – O Cristo vos disse: “Querer para o outro o que quereis para vós mesmo”...
Segundo o entendimento dos Espíritos a lei de Deus é inata e natural ao ser humano, portanto a justiça Divina preside todos os atos da nossa consciência como uma necessidade educativa, através das reencarnações sucessivas e do aperfeiçoamento espiritual (princípio fundamental da doutrina). 
Pesquisando as religiões mais antigas do mundo3, verificamos que todas elas possuem suas leis escritas ou código-ético/moral como o livro dos mortos (egípcios), Vedas (indianismo), Alcorão (Islamismo), Thorah (judaísmo) e a Bíblia no antigo e novo testamento (cristianismo). Jesus, o Cristo, sacramentou o respeito às Leis quando disse: “Não penseis que eu vim revogar a lei ou os profetas (Mateus, 5: 17 e 18): mas dar-lhes pleno cumprimento, pois em verdade vos digo que, até que passem o céu e a terra, não será omitido nem um só i, uma só vírgula da Lei, sem que tudo seja realizado”... Também procurou separar as leis humanas das Divinas quando disse: “Dai a César o que é de Cesar e a Deus o que é de Deus” (Mateus 22: 15 a 22)4. 
Assim, também na filosofia e na ciência, em todos os tempos, houve e haverá revelações de ordem divina, visando o esclarecimento do ser humano quanto às leis naturais e o aperfeiçoamento das leis humanas e da purificação espiritual, através das reencarnações sucessivas. Sócrates, Platão, Aristóteles, Lavoisier, Darwin, Einstein, assim como muitos outros, intelectuais, filósofos, teólogos, cientistas, conhecidos e desconhecidos, continuam caminhando com a evolução intelectual e moral, inerentes ao ser humano, revelando assim, passo a passo, as leis naturais e Divinasiii. 
Em qualquer parte do mundo para que as religiões possam exercer livremente a prática religiosa é necessário que se submetam às legislações locais; mesmo aquelas que privilegiam as religiões do estado (como é o caso de alguns países islâmicos e o Vaticano), assim, é necessário respeitar a ordem instituída, muitas vezes até preconceituosas.
Atualmente no Brasil nossa legislação é votada no Congresso Nacional, representado por três senadores por estado e na câmara dos deputados, proporcional à população de cada estado. As leis podem ser de iniciativa do governo executivo ou do legislativo, entrando em vigor quando aprovadas pelo presidente da república. 
A nossa última carta magna aprovada em 19885, possui, entre seus princípios fundamentais, o respeito à “dignidade da pessoa humana” (art. 1o item III), e a erradicação da pobreza, como também promover o bem-estar de todos, sem preconceitos (art. 3o item III). Apesar de ser democrática em seus princípios básicos, ainda sofre influências classistas e dos mais poderosos. Analisando os artigos da nossa constituição e legislações que vão de encontro com os princípios básicos da revelação dos Espíritos e da maioria das religiões que lutam em defesa da ética, da moralidade e da igualdade de tratamento estão:
A prevalência ou supremacia dos direitos humanos (art. 4º itens II, IV, IX e X). Devemos lutar para que esta supremacia prevaleça em todos os âmbitos através das legislações específicas e concordância em todos os níveis da sociedade, como o político nacional e internacional, científico e religioso.
Quanto à Inviolabilidade da liberdade e consciência de crença (art. 5o, item VI) ressalvo que está alinhada com a lei natural e a lei Divina, conforme questões 621 e 622 do LE. Este artigo, nos itens VII e VIII, relativo ao direito de assistência religiosa, entretanto, está dependente da regulamentação do futuro código penal. Como dissemos em artigo anterior6, as religiões ainda estão sujeitas ao decreto-lei 2.848 do código penal de 07/12/1940, nos artigos 256 e 286, por prática ilegal da medicina. Assim, qualquer prática religiosa como assistência ou tratamento (físico ou espiritual) pode ser enquadrada na lei. Entre os diversos médiuns espíritas penalizados por nossa legislação, podemos citar o Zé Arigó (prática ilegal da medicina) e Chico Xavier (direitos autorais de Humberto Campos em “Parnaso de Além-Túmulo”) e outros médiuns ainda se encontram com a espada de Dâmoclesiv sobre a cabeça. Porém quase todos os credos religiosos também estão sujeitos às mesmas leis, tanto do código civil como do código penal da atual constituição (artigo 22o da constituição); para seus registros civis (estatutos), regulamentação e penalizações. No presente momento existe uma comissão político/jurídica tratando da preparação do novo código penal, a qual, a AJE (Associação Jurídico-Espírita), AME (Associação Médico-Espírita) e outras associações ligadas ao objeto médico/jurídico Espírita, poderiam influenciar (invocando o direito constitucional do artigo 5o, referente ao direito de assistência religiosa ou Espiritual). Acredito que agora seja o momento propício para a retirada de todo autoritarismo, meritocrático e classista do antigo e ainda vigente código penal, defendendo, assim, uma posição ética e moral desta importante legislação de nosso país. Esta lei deve visar apenas os vendilhões do templo, ou seja, a exploração religiosa através de vigaristas, indução pública às doações e falsos rituais espirituais. Assim como está no atual código penal, muitos cristãos, como outrora, perseguidos pelos romanos e os inquisidores da igreja, seriam condenados, mesmo contrariando as Leis naturais e Divinas inatas ao homem, como é a comunicação dos Espíritos (mediunidade) e a reencarnação. 
Em conclusão a este trabalho, gostaríamos de alertar as associações e entidades espíritas para orientar (ampliar ou retificar) seus estatutos visando o suporte legal e o objeto Espírita em suas respectivas áreas de atuação. Alertar, também, quanto à importância da sua legalização estatutária (registro cartorial) e os benefícios da prática legal de seus trabalhos7.
Allan Kardec, em Obras Póstumas8, dedica um capítulo especial à constituição do Espiritismo e nos alerta sobre a necessidade que os princípios doutrinários sejam precisos e inquestionáveis para evitar possíveis cismas/questionamentos que possam prejudicar os princípios básicos da doutrina. Neste capitulo Kardec deixa bem claro que o Espiritismo não precisa de uma chefia (dirigente), segundo suas qualificações administrativas (ou técnicas), mas segundo sua exemplificação moral; devendo os mesmos serem eleitos por um conselho executivo. Neste mesmo capítulo ele deixa sua orientação para a constituição de um estatuto, bem como, que todas as dúvidas doutrinárias fossem aprovadas por um congresso de caráter científico. 
Assim sendo, não nos esqueçamos de que a legítima e inexorável lei Divina está escrita na CONSCIÊNCIA e não nas leis escritas pelo homem, que são falhas e, por isto mesmo, precisam ser revistas e sempre atualizadas.

. A venda nos olhos significa imparcialidade, a espada é o símbolo da força de que dispõe para impor o direito. Algumas representações da Justiça possuem também uma balança que representa a ponderação dos interesses das partes em litigio.
ii. Legislação (do latim legislatione) é um conjunto de leis de determinada matéria e ciência das Leis.
iii. Consultar a classificação de saúde da WHO (Organização mundial de Saúde) CID-10, F44-3- Estados de transtornos e de possessão.
iv. Mito grego sobre um cortesão familiar de Dionísio, tirano de Siracuse (IV a.C.), que para demonstrar sua fragilidade, cedeu-lhe seu lugar no trono por um dia e, dependurou uma espada acima do mesmo, presa por um fio de crina de cavalo.

1. KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo, cap. V, item 5, trad. de Guillon Ribeiro da 3ª edição. 125ª edição. FEB, 2006.
2. ___. O Livro dos Espíritos, trad. de José Herculano Pires, perguntas 875 e 876. Ed. Lake. 2002.
3. Enciclopédia livre e Wikipédia. www.wikipedia.org.com.br 
4. Bíblia de Jerusalém, editora Paulus, 3ª. Impressão de 2004.
5. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm 
6. BARRETO, Henri B.F., Revista Internacional de Espiritismo (RIE), “Leis Morais e Éticas na Prática Religiosa”. Casa Editora O Clarim, julho 2012. 
7. Artigo sobre atualização segundo o novo código civil publicado no Jornal Alavanca da USE Campinas. 2007.
8. KARDEC, Allan. Obras Póstumas. Constituição do Espiritismo, cap. I, pág. 345 a 372, 13ª edição, trad. de Guillon Ribeiro, Federação Espírita Brasileira (FEB).

http://www.oclarim.org/

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