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sexta-feira, 30 de maio de 2014

$alvação - Já comprou a sua hoje?


  Em dias como os de hoje, em que a sociedade experimenta uma grande crise moral, percebe-se por todos os lados a agitação perturbadora. Não apenas pela conquista de um lugar ao sol, mas também pela busca de um significado para a existência terrena.
  Se de um lado, temos a oferta de uma sociedade fluida, voltada para futilidades e para a realização dos instintos mais primitivos, por outro, temos o forte apelo comovedor das religiões tradicionais que visam garantir um lugarzinho no Reino dos Céus aos pecadores de vária ordem. São endividados, desempregados, ex-estrelas da mídia, depressivos, drogadictos, assassinos, prostitutas, assaltantes de banco e até molestadores, todos merecem um lugarzinho no Céu, com exceção do corrupto que já comprou antecipadamente um cantinho no paraíso fiscal. Este não precisa de Céu! 
  Todas as religiões, invariavelmente, possuem sua proposta de salvação e redenção para a Humanidade. No Ocidente, então, nem se fala. Não ficamos atrás do fanatismo encontrado em outras culturas e damos uma verdadeira aula acerca da exclusividade salvífica. As duas maiores religiões que levam o rótulo de Cristianismo, o Catolicismo e o Protestantismo, prometem a salvação exclusivista e a garantia do gozo pleno em um paraíso ocioso em que os mortos após terem sido ressuscitados e tornados zumbis, pois levantar-se-ão das catacumbas com seus restos mortais apodrecidos, e serão escolhidos por Jesus para ingressarem no Paraíso com seus corpos restabelecidos. Só esqueceram de avisar que não dá para recuperar o corpo de quem foi cremado. Este não vai para o Céu!
  A Parusia é o nome que se dá à promessa de retorno de Jesus à Terra. Esta ideia de que ele vai voltar, tão bem divulgada pelos protestantes em muros, adesivos em automóveis, faixas no trânsito, outdoors, não é nova. Os primeiros cristãos já acreditavam nesta possibilidade há 18 séculos.
  Já passou tanto tempo e ele não voltou ainda? Por que demora tanto?
  O próprio Paulo de Tarso, considerado por muitos teólogos como o primeiro protestante que surgiu na Humanidade, pois fazia de tudo para converter um pagão em cristão, foi adepto desta crença, a Parusia - a ideia de que Jesus voltaria no dia do juízo final para separar os bodes das ovelhas e levar os eleitos ao Paraíso.
  O nascimento deste pensamento entre os cristãos tem duas origens. A primeira vem da perseguição dos judeus que o grupo dos cristãos primitivos passou a sofrer após a morte de seu líder, Jesus. Pedro e Tiago, irmão de Jesus, fizeram de tudo para que os adeptos continuassem suas práticas como judeus, porém tendo como princípio de filosofia de vida, não apenas a Torá, mas também o pensamento do Homem de Nazaré. Isto tornou-se inviável, principalmente devido à falta de compreensão da própria mensagem.
  Se quem conviveu com ele não o entendeu, imagine os de hoje, depois de mais de dois mil anos?
  Com esta perseguição social, uma espécie de marginalização e rejeição, os cristãos passaram a desenvolver a crença de que ele voltaria, à semelhança de um justiceiro para salvar os perseguidos e injustiçados. Graças a esta crença, milhares de cristãos se precipitaram como lunáticos e fanáticos nos circos romanos.
  Um segundo ponto que explica a origem deste mal-estar social, vem da inspiração de ideias apocalípticas  bem comum entre judeus do I século a.C. Insuflado pelo contexto opressor ao qual foi submetido devido ao domínio de Roma na Judeia, e pela empolgação devotada à causa que abraçou de corpo e alma, o senhor Paulo de Tarso fez de tudo para difundir a crença de que Jesus era o salvador da Humanidade e que mesmo alguém que não fosse judeu e monoteísta, poderia aceitá-lo e assim usufruir de sua companhia primeiramente aqui na Terra, incorporando-o em sua vida, o que se observa na sua frase, "já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim." Em seguida, o cristão seria escolhido pela graça divina para estar entre os que iriam para o Céu.
  O misticismo de Paulo é nítido em suas cartas, bem como a sua falta de compreensão no que diz respeito a Jesus, como Homem e mestre. Percebe-se nelas a grande dificuldade que ele tem em compreender o objetivo da presença do Nazareno entre os homens. Estes textos atribuídos a Paulo, revelam, se for feita uma leitura atenta, que foi apenas no fim de sua existência que ele começou a compreender que a salvação da Humanidade estaria em reavaliar os erros cometidos, através do arrependimento sincero. O tempo passou, muitos foram mortos e seu Senhor não voltou como ele havia acreditado que assim ocorreria um dia. Que decepção!!!
  As cartas de Paulo, portanto deram a base substancial para a teoria salvacionista encontrada na Igreja Católica e posteriormente, entre os reformistas protestantes. A venda das Indulgências que foi amplamente praticada pela Igreja durante a Idade Média, consistia na compra do perdão dos pecados, cometidos pelos homens, especialmente, os ricos. O comércio da salvação chegou ao ponto do morto levar no caixão, uma carta de recomendação para Pedro, que segundo a crença cristã, até hoje é o chaveiro do Céu.
  A salvação estava posta e quem a desejasse, teria que simplesmente aceitar este dogma: "extra ecclesiam nulla salus" que em Latim quer dizer: "FORA DA IGREJA NÃO HÁ SALVAÇÃO." Ou seja, se você não fizer parte desta religião que foi enviada por Deus à Terra, ou melhor, que foi fundada pelo próprio Deus que tomou forma humana, você não irá para o Céu e sim para o Inferno.
  Os protestantes tentando melhorar a situação, cometeram outro erro e estabeleceram o seguinte: "FORA DA FÉ NÃO HÁ SALVAÇÃO." Mesmo que a Reforma promovida por João Calvino e Martinho Lutero tenha sido uma grande mudança, ainda assim não conseguiu dar ao Homem a liberdade de suas escolhas e a responsabilidade por elas. A religião, além disso, continuou a promover a separação dos "irmãos cristãos bonzinhos". 
  Até dentro de uma mesma família, aquele que comunga na Igreja, acha que o seu familiar por pertencer a tal Fé, irá para o Inferno. E tem mais: aquele que não estiver nem dentro da Igreja, nem na Fé protestante, deve estar para lá do Inferno!!! E isto inclui judeus, muçulmanos, espiritistas, umbandistas, jansenistas, hinduístas, budistas, e outros "istas" que estão sentenciados eternamente ao fogo do Inferno.
  Por que assim será? Porque não aceitaram Jesus, como seu único salvador. Por isto que a frase atribuída a Jesus, "Eu sou o caminho a verdade e a vida, e ninguém irá ao Pai senão por mim", é altamente suspeita. Além dela não ser encontrada em alguns textos antigos, mas por outro lado presente em outros importantes, o que não implica dizer que não foram manipulados, a frase revela o poder político de dominação de uma religião sobre as demais. Ou seja, torne-se meu discípulo, pois sou o único caminho que leva a Deus. Abandone seu Buda, seu Maomé, seu Krishina e siga-me se quiser ser salvo! 
  É ou não é uma salvação exclusivista?
  E o que mais impressiona é a tentativa por parte de cristãos de falar em ecumenismo. Será mesmo que existe isto? 
  No ano de 1979, o Papa João Paulo II tentou amenizar  a situação dos que vão para o Inferno. Ele publicou a encíclica, Redemptor Hominis, que afirma que"todo homem, sem exceção, foi redimido por Cristo, mesmo quando este homem não esteja consciente disto." Os que buscam um diálogo entre religiosos festejaram a publicação da encíclica. Porém, não é preciso ser nenhum doutor em Teologia para perceber que o Papa está dizendo nas entrelinhas que a salvação vem de Cristo, simplesmente pela sua morte por nós. Isto significa que, mesmo que o indivíduo seja ateu, hinduísta, muçulmano ou judeu, ele vai para o Céu, porque Cristo deu a vida por ele.
Isto é ecumenismo? Ou isto está mais para uma inclusão na exclusividade cristã?
  Como pode haver ecumenismo se impomos nossa crença e maneira de pensar, ou se nem permitimos que outros pensem? E quando pensem, coisa que é rara, é permitido pensar diferente da Igreja ou questionar a Fé protestante?
  Vejamos o que disse João Calvino acerca da venda do arrependimento na hora da morte, e de como ele entende a salvação do homem, "a estranha noção de quem pensa que os que não criam na vinda de Cristo foram libertos dos seus pecados após a sua morte não mais necessita de refutação; porquanto é uma doutrina indubitável da Escritura que nós não obtemos salvação em Cristo exceto pela fé; logo não há nenhuma esperança para aqueles que continuam a ser não-crentes até a morte."
  E agora? O que, por exemplo, o Cristianismo com sua salvação exclusivista quer na Fé quer na Igreja dirá àqueles que passam pela morte de entes queridos? Para onde irá a alma deles? Qual consolo e qual explicação a religião dará?
  Deu tempo para obterem a salvação?
por Liszt Rangel 

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