Em dias como os de hoje, em que a
sociedade experimenta uma grande crise moral, percebe-se por todos os
lados a agitação perturbadora. Não apenas pela conquista de um lugar ao
sol, mas também pela busca de um significado para a existência terrena.
Se de um lado, temos a oferta de uma
sociedade fluida, voltada para futilidades e para a realização dos
instintos mais primitivos, por outro, temos o forte apelo comovedor das
religiões tradicionais que visam garantir um lugarzinho no Reino dos
Céus aos pecadores de vária ordem. São endividados, desempregados,
ex-estrelas da mídia, depressivos, drogadictos, assassinos, prostitutas,
assaltantes de banco e até molestadores, todos merecem um lugarzinho no
Céu, com exceção do corrupto que já comprou antecipadamente um cantinho
no paraíso fiscal. Este não precisa de Céu!
Todas as religiões, invariavelmente,
possuem sua proposta de salvação e redenção para a Humanidade. No
Ocidente, então, nem se fala. Não ficamos atrás do fanatismo encontrado
em outras culturas e damos uma verdadeira aula acerca da exclusividade
salvífica. As duas maiores religiões que levam o rótulo de Cristianismo,
o Catolicismo e o Protestantismo, prometem a salvação exclusivista e a
garantia do gozo pleno em um paraíso ocioso em que os mortos após terem
sido ressuscitados e tornados zumbis, pois levantar-se-ão das catacumbas
com seus restos mortais apodrecidos, e serão escolhidos por Jesus para
ingressarem no Paraíso com seus corpos restabelecidos. Só esqueceram de
avisar que não dá para recuperar o corpo de quem foi cremado. Este não
vai para o Céu!
A Parusia é o nome que se dá à promessa
de retorno de Jesus à Terra. Esta ideia de que ele vai voltar, tão bem
divulgada pelos protestantes em muros, adesivos em automóveis, faixas no
trânsito, outdoors, não é nova. Os primeiros cristãos já acreditavam
nesta possibilidade há 18 séculos.
Já passou tanto tempo e ele não voltou ainda? Por que demora tanto?
O próprio Paulo de Tarso, considerado
por muitos teólogos como o primeiro protestante que surgiu na
Humanidade, pois fazia de tudo para converter um pagão em cristão, foi
adepto desta crença, a Parusia - a ideia de que Jesus voltaria no dia do
juízo final para separar os bodes das ovelhas e levar os eleitos ao
Paraíso.
O nascimento deste pensamento entre os
cristãos tem duas origens. A primeira vem da perseguição dos judeus que o
grupo dos cristãos primitivos passou a sofrer após a morte de seu
líder, Jesus. Pedro e Tiago, irmão de Jesus, fizeram de tudo para que os
adeptos continuassem suas práticas como judeus, porém tendo como
princípio de filosofia de vida, não apenas a Torá, mas também o
pensamento do Homem de Nazaré. Isto tornou-se inviável, principalmente
devido à falta de compreensão da própria mensagem.
Se quem conviveu com ele não o entendeu, imagine os de hoje, depois de mais de dois mil anos?
Com esta perseguição social, uma
espécie de marginalização e rejeição, os cristãos passaram a desenvolver
a crença de que ele voltaria, à semelhança de um justiceiro para salvar
os perseguidos e injustiçados. Graças a esta crença, milhares de
cristãos se precipitaram como lunáticos e fanáticos nos circos romanos.
Um segundo ponto que explica a origem
deste mal-estar social, vem da inspiração de ideias apocalípticas bem
comum entre judeus do I século a.C. Insuflado pelo contexto opressor ao
qual foi submetido devido ao domínio de Roma na Judeia, e pela
empolgação devotada à causa que abraçou de corpo e alma, o senhor Paulo
de Tarso fez de tudo para difundir a crença de que Jesus era o salvador
da Humanidade e que mesmo alguém que não fosse judeu e
monoteísta, poderia aceitá-lo e assim usufruir de sua companhia
primeiramente aqui na Terra, incorporando-o em sua vida, o que se
observa na sua frase, "já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em
mim." Em seguida, o cristão seria escolhido pela graça divina para estar
entre os que iriam para o Céu.
O misticismo de Paulo é nítido em suas
cartas, bem como a sua falta de compreensão no que diz respeito a Jesus,
como Homem e mestre. Percebe-se nelas a grande dificuldade que ele tem
em compreender o objetivo da presença do Nazareno entre os homens. Estes
textos atribuídos a Paulo, revelam, se for feita uma leitura atenta,
que foi apenas no fim de sua existência que ele começou a compreender
que a salvação da Humanidade estaria em reavaliar os erros cometidos,
através do arrependimento sincero. O tempo passou, muitos foram mortos e
seu Senhor não voltou como ele havia acreditado que assim ocorreria um
dia. Que decepção!!!
As cartas de Paulo, portanto deram a
base substancial para a teoria salvacionista encontrada na Igreja
Católica e posteriormente, entre os reformistas protestantes. A venda
das Indulgências que foi amplamente praticada pela Igreja durante a
Idade Média, consistia na compra do perdão dos pecados, cometidos pelos
homens, especialmente, os ricos. O comércio da salvação chegou ao ponto
do morto levar no caixão, uma carta de recomendação para Pedro, que
segundo a crença cristã, até hoje é o chaveiro do Céu.
A salvação estava posta e quem a
desejasse, teria que simplesmente aceitar este dogma: "extra ecclesiam
nulla salus" que em Latim quer dizer: "FORA DA IGREJA NÃO HÁ SALVAÇÃO."
Ou seja, se você não fizer parte desta religião que foi enviada por Deus
à Terra, ou melhor, que foi fundada pelo próprio Deus que tomou forma
humana, você não irá para o Céu e sim para o Inferno.
Os protestantes tentando melhorar a
situação, cometeram outro erro e estabeleceram o seguinte: "FORA DA FÉ
NÃO HÁ SALVAÇÃO." Mesmo que a Reforma promovida por João Calvino e
Martinho Lutero tenha sido uma grande mudança, ainda assim não conseguiu
dar ao Homem a liberdade de suas escolhas e a responsabilidade por
elas. A religião, além disso, continuou a promover a separação dos
"irmãos cristãos bonzinhos".
Até dentro de uma mesma família, aquele
que comunga na Igreja, acha que o seu familiar por pertencer a tal Fé,
irá para o Inferno. E tem mais: aquele que não estiver nem dentro da
Igreja, nem na Fé protestante, deve estar para lá do Inferno!!! E isto
inclui judeus, muçulmanos, espiritistas, umbandistas, jansenistas,
hinduístas, budistas, e outros "istas" que estão sentenciados
eternamente ao fogo do Inferno.
Por que assim será? Porque não
aceitaram Jesus, como seu único salvador. Por isto que a frase atribuída
a Jesus, "Eu sou o caminho a verdade e a vida, e ninguém irá ao Pai
senão por mim", é altamente suspeita. Além dela não ser encontrada em
alguns textos antigos, mas por outro lado presente em outros
importantes, o que não implica dizer que não foram manipulados, a frase
revela o poder político de dominação de uma religião sobre as demais. Ou
seja, torne-se meu discípulo, pois sou o único caminho que leva a Deus.
Abandone seu Buda, seu Maomé, seu Krishina e siga-me se quiser
ser salvo!
É ou não é uma salvação exclusivista?
E o que mais impressiona é a tentativa por parte de cristãos de falar em ecumenismo. Será mesmo que existe isto?
No ano de 1979, o Papa João Paulo II
tentou amenizar a situação dos que vão para o Inferno. Ele publicou a
encíclica, Redemptor Hominis, que afirma que"todo homem, sem exceção,
foi redimido por Cristo, mesmo quando este homem não esteja consciente
disto." Os que buscam um diálogo entre religiosos festejaram a
publicação da encíclica. Porém, não é preciso ser nenhum doutor em
Teologia para perceber que o Papa está dizendo nas entrelinhas que a
salvação vem de Cristo, simplesmente pela sua morte por nós. Isto
significa que, mesmo que o indivíduo seja ateu, hinduísta, muçulmano ou
judeu, ele vai para o Céu, porque Cristo deu a vida por ele.
Isto é ecumenismo? Ou isto está mais para uma inclusão na exclusividade cristã?
Como pode haver ecumenismo se impomos
nossa crença e maneira de pensar, ou se nem permitimos que outros
pensem? E quando pensem, coisa que é rara, é permitido pensar diferente
da Igreja ou questionar a Fé protestante?
Vejamos o que disse João Calvino acerca
da venda do arrependimento na hora da morte, e de como ele entende a
salvação do homem, "a estranha noção de quem pensa que os que não criam
na vinda de Cristo foram libertos dos seus pecados após a sua morte não
mais necessita de refutação; porquanto é uma doutrina indubitável da
Escritura que nós não obtemos salvação em Cristo exceto pela fé; logo
não há nenhuma esperança para aqueles que continuam a ser não-crentes
até a morte."
E agora? O que, por exemplo, o
Cristianismo com sua salvação exclusivista quer na Fé quer na Igreja
dirá àqueles que passam pela morte de entes queridos? Para onde irá a
alma deles? Qual consolo e qual explicação a religião dará?
Deu tempo para obterem a salvação?
por Liszt Rangel
Nenhum comentário:
Postar um comentário