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segunda-feira, 16 de setembro de 2013

MUITO ALÉM DA MORTE

Escreve: José RodriguesEm: Julho de 2013
 
Com 30 milhões de adeptos e um mercado com 8 milhões de livros, Brasil lidera o espiritismo, criado há 150 anos por Allan Kardec.
Por José Rodrigues, para o Valor, de Santos. (*)
 
A livraria do monsieur Dentu, na loja 13 da Galérie D’Orléans, Palais Royal de Paris, na manhã de 18 de abril de 1857, apresentou movimento incomum. Por três francos, estava sendo lançado “O Livro dos Espíritos”, de Allan Kardec, pseudônimo do professor Hippolyte Léon Denizard Rivail, após mais de três anos de tratos e investigações, via mediúnica, com personalidades já mortas. O documento, iniciado com a pergunta “O que é Deus?”, ao completar 150 anos, o tempo de vida da filosofia espírita, trouxe uma temática que, embora originária de fenômenos naturais, enfrentaria caminhos tortuosos, até atingir o estágio de aceitação, pelo menos no Brasil.
 
A explosão da literatura que trata desses fenômenos — mais de 8 milhões de livros vendidos em um ano — surpreende pelo seu volume e explica a entrada nesse mercado de novas editoras, cujo número já é estimado em 180. “As pessoas estão mais livres e querem exercitar o raciocínio, buscar explicações”afirma Wilson Frungilo, presidente do IDE-Araras (SP) editora que, desde sua criação, em 1963, vendeu quase 7 milhões de livros de Allan Kardec.
 
Seja pelas repercussões libertárias do iluminismo ou pelos frutos institucionais que emergiam da Revolução Francesa, a despeito do golpe de Napoleão III (1851), que fez retomar o império, Rivail decidiu enfrentar o desafio das “tables tournantes et les esprits frappeurs” (mesa-branca, numa tradução livre) que se tornaram comuns nos principais centros europeus. Educado na escola de Pestalozzi, em Yverdun, Suíça, Rivail teria apreendido conceitos universalistas de liberdade de crença, algo que tem atrapalhado a convivência humana e respondido por conflitos cruentos. Com visão atualizada de seu tempo, poliglota, Rivail já era conhecido no meio educacional da França. Em 1828, aos 24 anos, publicou o “Plan Proposé pour l’Amélioration de l’Educacion Publique”.
 
A tese espírita, baseada na explicação dos fenômenos, visava a decifrar enigmas de todos os tempos quanto à sobrevivência pós-morte, enquanto a reencarnação, parte da lei de evolução, uma das bases do espiritismo, nivelaria todos em oportunidades de crescimento.
 
A literatura do ramo coloca o lugarejo de Hydesville, no Estado de Nova York, em 1848, como ponto de partida de um edifício, cujo principal mérito ficou por conta da ordenação e sistematização, entre causas e efeitos, do sobrenatural. As irmãs Kate, de apenas 11 anos, e Margareth Fox, de 14, foram protagonistas de “comunicações” de espíritos, por meio de batidas, os conhecidos “raps”. Transpostas para a Europa, viraram atrações familiares, por meio das mesas que dançavam.
 
Aos 50 anos, Rivail foi atraído para os fenômenos por Fortier, conhecido magnetizador, que lhe falou sobre “mesas que podiam girar e andar à vontade”. Em um segundo contato, o mesmo interlocutor assegurou-lhe que as mesas “não somente dançam, mas podem falar. Interrogam-nas e elas respondem”, conforme relato do próprio Rivail, em documentos publicados em “Obras Póstumas”(Paris, 1890, Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas).
 
De frívolas, as reuniões com o educador transformaram-se em sérias. Com o concurso de duas jovens da família Baudin, Caroline, de 16 anos, e Julie, de 14, que acionavam, por atribuída ação mediúnica, uma cesta com lápis à ponta, resultando em escrita sobre uma prancheta, Rivail passou de professor a investigador. Antes, ele havia dito a Fortier que só acreditaria na afirmação do amigo vendo in loco e quando lhe provassem que “a mesa tem cérebro para pensar, nervos para sentir e pode tomar-se sonâmbula”.
 
Realizadas na casa da Rua Rochechouart, 18, em Paris, as sessões significaram para Rivail a “revelação de uma nova lei” que ele prometeu a si mesmo “investigar a fundo”. Logo descobriu que os espíritos, “nada mais sendo que as almas dos homens, não possuíam nem a suprema sabedoria nem a suprema ciência”. Acrescenta que vislumbrou naqueles fenômenos “a chave do problema do passado e do futuro da humanidade. Era uma revolução total nas ideias e nas crenças existentes”.
 
O resultado foi um livro com 501 questões e igual número de respostas que o livreiro E. Dentu decidiu publicar, após cerca de 35 meses de investigações. Dentu viria a se tomar parceiro de várias outras publicações do já então Allan Kardec. Uma segunda edição, em 1860, continha mais que o dobro de perguntas, com abordagem sobre causas primárias do universo, mundo dos espíritos, leis morais e esperanças e consolações.
 
Motivo de proibições desde Moisés, que no “Deuteronômio” impõe que “nunca exista entre vós quem consulte adivinhos (...), quem interrogue os mortos”, por pastorais da Igreja Católica, a primeira do cardeal-arcebispo de Reims, na França, na Quaresma de 1865, a fenomenologia espírita chega ao século 21 robustecida. Ficam para trás, no Brasil, a primeira Constituição (1824), que fixava o catolicismo como religião oficial, ou o Código Penal, de 1890, que restringia as práticas espíritas.
 
EMPREITADA VIÁVEL
 
Fundada em 1884, a Federação Espírita Brasileira (FEB) vendeu, até 2006, 44 milhões de livros espíritas. Dona de um catálogo com mais de 400 títulos, só com as obras de Allan Kardec já vendeu 11,5 milhões de exemplares. “Em 2006 colocamos 915 mil livros para vender e neste ano deveremos chegar a 1 milhão. No primeiro trimestre vimos um crescimento de 77%, com 228 mil unidades colocadas”, comemora Ílcio Bianchi, diretor da FEB e gerente da revista“Reformador”, publicada de forma ininterrupta desde sua criação, em 1883, um ano antes da atual editora.
 
“Há alguns anos os livros espíritas ficavam escondidos nas livrarias. Hoje estão perto dos caixas, tal a procura”, assinala Cléber Galhardi, diretor-comercial da Boa Nova, distribuidora e editora de livros espíritas, instalada em Catanduva (SP). A empresa, que vendeu 1 milhão de livros em 2006, espera crescimento de 7%, em 2007. De “O Livro dos Espíritos”, no ano passado, colocou no mercado 44,8 mil exemplares. Uma enquete no site da Boa Nova mostra que 16,8% dos consultados leem de um a três livros espíritas por ano. Na escala, a maior fica com os que leem mais de 12 obras, 43,5%. Esse elevado porcentual deve explicar a viabilização da empreitada livreira.
 
O Instituto de Difusão Espírita (IDE) não fica atrás. Com 180 títulos, 78 deles em espanhol, vendeu, em 2006, 1,23 milhão de unidades, das quais 60 mil de “O Livro dos Espíritos”. O formato de bolso da editora custa R$ 5,90. A Laselva, que tem livrarias em aeroportos e terminais rodoviários e ferroviários, ostenta 100 títulos espíritas, cerca de 8% de seu catálogo. Em janeiro, vendeu 6 mil livros do gênero, do total de 120 mil, segundo seu gerente de produtos, Adriano Santana.“A apresentação dos livros espíritas melhorou muito e a mídia, em geral, está alavancando as vendas”, diz. Essa mídia tem peso quase total das novelas da TV Globo, pontuadas por aparições de entidades que já não pertencem a este plano. Em “Páginas da Vida”, apresentada no horário nobre, a personagem Nanda, já morta, aparecia constantemente aos parentes.
 
À MODA BRASILEIRA
 
A contagem de cerca de 30 milhões de simpatizantes do espiritismo no Brasil, número admitido pela Federação Espírita Brasileira (FEB), ante 2,4 milhões de adeptos assinalados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), não revela a existência de uma diferença entre religiosos e não religiosos, ou laicos, no meio espírita. Um segmento entende o espiritismo como ciência, filosofia e religião, enquanto outro, minoritário, ciência, filosofia e moral.
 
Recente literatura do tema está na praça, como “Espiritismo à Brasileira”, da antropóloga Sandra Jacqueline Stoll, tese de doutorado na USP (Edusp, 2003), e“Espiritismo - Uma Religião Brasileira”, de José Luiz dos Santos (Átomo, 2004), professor de antropologia, Ph.D. da Universidade de Londres. Stoll sustenta que a ênfase à ciência espírita “foi mantida apenas por alguns grupos de elite. A tendência dominante, porém, consiste em atribuir à doutrina espírita uma feição essencialmente religiosa. O papel de Chico Xavier (Francisco Cândido Xavier, 1910-2001) nesse contexto não é criação dessa versão, mas a consolidação, por meio do exemplo de vida, de uma reinterpretação católica da doutrina espírita”.
 
Como representação dos laicos está a Confederação Espírita Pan-Americana (Cepa), fundada em 1946. Possui filiados em vários países da América Latina, no Caribe (Cuba) e mesmo na Espanha, França e Austrália. “A Cepa é um movimento de ideias, tem proposta humanista, livre-pensadora, laica e progressista, que respeita todas as culturas como expressões legítimas do progresso intelectual e moral dos povos”, define Milton Medran Moreira, advogado, jornalista e escritor, presidente da entidade. Ele é autor do livro“Direito e Justiça - Um Olhar Espírita” (Imprensa Livre, 2004).
 
O interesse pelo aspecto científico do espiritismo ganha espaço também na obra“Mecanismos da Mediunidade - Processo de Comunicação Mediúnica” do médico sanitarista e mestre em saúde coletiva pela Unicamp Ademar Arthur Chioro dos Reis (CPDoc, 2005).
 
Essa literatura, que busca trazer o além para o aqui e o agora, fora do segmento de autoajuda, tem correspondência em pesquisas no campo da transcomunicação instrumental, que trata, entre outros aspectos, da gravação de vozes diretas de espíritos. O site www.ipa-ti.org, coordenado pela pedagoga Sônia Rinaldi, reproduz algumas dessas experiências.
 
“Todo esse empenho tem direção certa: tirar do homem a incerteza do amanhã, pela comprovação da imortalidade, e levar o espiritismo ao estágio da influenciação social”, sustenta Moreira.
 
(*) O presente artigo foi publicado no suplemento cultural EU& do jornal paulistano Valor Econômico (13 a 15 de abril de 2007, ano 7, nº 341), do qual José Rodrigues era correspondente na Baixada Santista, por ocasião do sesquicentenário do Espiritismo.
 
José Rodrigues (1937-2010), economista e jornalista, um dos fundadores e editores do site Pense - Pensamento Social Espírita e fundador da ARS - Ação de Recuperação Social, de Santos-SP, foi redator do periódico Espiritismo e Unificação e membro do conselho de redação do Abertura - jornal de cultura espírita. É autor do livro “Vila Socó: Uma Tragédia Programada”.
 
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