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segunda-feira, 8 de abril de 2013

Cizânias e dissidências


“Vim separar de seu pai o filho, de sua mãe a filha, de sua sogra 
a nora; e o homem terá por inimigos os de sua própria casa”.
- Jesus. (Mt.; 10:35.36.)
          Como toda escola de pensamento, o Espiritismo tem seus adeptos e contraditores, isto é, criaturas que o acoroçoam e outras que tem por inimigas...
          Adversários e adeptos se dividem em várias modalidades, conforme podemos compreender pelas explicações oferecidas por Allan Kardec na Codificação Espírita. Incompreensões existem não somente por parte dos inimigos do Espiritismo, mas também por parte dos adeptos, haja vista as tricas que nada deixam a dever às maquinações farisaicas do tempo de Jesus, e que pululam no movimento espírita, corporificadas pela saraivada de anátemas mútuos lançados indiscriminadamente em todas as direções...
          Jesus foi e ainda é o Grande Incompreendido pelos que se consideram cristãos, vez que não obstante, sendo Sua a Lei de amor, na verdade, paradoxalmente, a cizânia é que é praticada em larga escala.
          As incompreensões, as rixas partidárias, as ciumeiras, as invejas, fazem parte do acervo da limitada individualidade humana, e é por isso que todas as criaturas que viveram à frente de seu tempo, como “pontas de lanças”, sofreram as conseqüências danosas por suas idéias revolucionárias e pagaram alto preço pelo atrevimento de tentar acordar a Humanidade do ancilosante marasmo em que se locupleta.
          Evidentemente o Espiritismo não se encontra infenso a essa particularidade antropológica, aliás, prevista por Jesus no versículo em epígrafe.
          No livro “Libertação”, através da mediunidade de Francisco C. Xavier, André Luiz narra a lenda egípcia do peixinho vermelho, que por ter dito uma visão mais abrangente da realidade em que vivia junto com os seus companheiros, foi expulso do tanque, da mesma forma que foi expulso do templo aquele cego de nascença que Jesus curou, porque ostentava uma realidade insofismável que os fariseus, do alto pedestal do orgulho em que se colocavam, não puderam contemplar e muito menos admitir.
          Sócrates, que viveu milênios à frente de seu tempo foi obrigado a beber cicuta; e assim sempre aconteceu com os Espíritos de vanguarda que aqui aportaram para fazer com que a Humanidade avançasse na senda do progresso.
          Allan Kardec tem sido o grande incompreendido tanto pelos não espíritas quanto pelos espíritas propriamente ditos. E, em conseqüência, o Espiritismo também não tem tido melhor sorte...
          Herculano Pires, atento a essas questões, oferece-nos uma explicação lógica e clara para a existência das cizânias e dissidências. Segundo esse grande escritor espírita este estado de coisas se deve ao fato de que o Espiritismo é uma doutrina do futuro, e como tal, não foi ainda devidamente assimilada pelas criaturas; daí as incompreensões que campeiam por todos os lados e até mesmo a explicação do absurdo dos absurdos que é a incompreensível e antecipadamente malograda tentativa de “atualização de Kardec” perpetrada por alguns “entendidos” (!?)
Segundo Herculano Pires[1],
          “(...) Mais de um século após o advento da Codificação do Espiritismo, reina ainda grande incompreensão a respeito da Doutrina Espírita, de sua própria natureza e de sua finalidade. A Codificação, entretanto, foi elaborada em linguagem clara, precisa, acessível a todos. À lucidez natural do espírito francês, Kardec juntava a sua vocação e a sua experiência pedagógicas, além da compreensão invulgar de tratar com matéria sumamente complexa.
          Vemo-lo afirmar, a cada passo, que desejava escrever de maneira a não deixar margem a interpretações, ou seja, para divergências interpretativas.
          Qual o motivo, então, por que os próprios adeptos do Espiritismo, ainda hoje, divergem, no tocante a questões doutrinárias de importância? E qual o motivo por que os não-espíritas continuam a tratar o Espiritismo com a maior incompreensão? Note-se que não nos referimos aos adversários, pois estes têm a sua razão, mas aos “não-espíritas”. Parece-nos que a explicação, para os dois casos, é a mesma. O Espiritismo é uma doutrina do futuro. À maneira do Cristianismo, abre caminho no mundo, enfrentando a incompreensão de adeptos e não-adeptos.
          Em primeiro lugar, há o problema da posição da doutrina: Uns a encaram como sistematização de velhas superstições; outros, como tentativa frustrada de elaboração científica; outros, como ciência infusa, não organizada; outros ainda, como esboço impreciso de filosofia religiosa; outros, como mais uma seita, entre as muitas seitas religiosas do mundo. Para a maioria dos adeptos e não-adeptos, o Espiritismo se apresenta como simples “crença”, espécie de religião e superstição, ao mesmo tempo, eivada de resíduos mágicos.
          Ao contrário de tudo isso, porém, o Espiritismo, segundo a definição de Kardec e dos seus principais continuadores, constitui a última fase do processo do conhecimento. Última não no sentido de fase final, mas da que o homem pôde atingir até agora, na sua lenta evolução através do tempo. É evidente que se trata do conhecimento em sentido geral, não limitado a um determinado aspecto, não especializado... Nesse sentido geral, o Espiritismo aparece como uma síntese dos esforços humanos para compreensão do mundo e da Vida. Justifica-se, assim, que haja dificuldade para a sua compreensão, apesar da clareza da estrutura doutrinária da Codificação. De um lado, o povo não pode abarcá-lo na sua totalidade, contentando-se com o seu aspecto religioso; de outro, os especialistas não admitem a sua natureza sintética; e de outro, ainda os preconceitos culturais levantam numerosas objeções aos seus princípios”.
          Como então identificar os Verdadeiros Espíritas? Em qual setor encontra-se o verdadeiro sentido do Espiritismo? Quem, afinal está com a razão e caminhando na direção certa? Para responder a estas indagações, só mesmo recorrendo à Codificação Espírita[2], onde o Espírito de Verdade desenhou o perfil e a performance do Espírita Cristão, isto é, dos Verdadeiros OBREIROS DO SENHOR.
          Ditosos os que hajam dito a seus irmãos: “Trabalhemos juntos e unamos os nossos esforços, a fim de que o Senhor, ao chegar, encontre acabada a obra”, porquanto o Senhor lhes dirá: “Vinde a mim, vós que sois bons servidores, vós que soubestes impor silêncio aos vossos ciúmes e às vossas discórdias, a fim de que daí não viesse dano para a obra!” Mas, ai daqueles que, por efeito das suas dissensões, houverem retardado a hora da colheita, pois a tempestade virá e eles serão levados no turbilhão!   Clamarão: “Graça! graça!” O Senhor, porém, lhes dirá: “Como implorais graças, vós que não tivestes piedade dos vossos irmãos e que vos negastes a estender-lhes as mãos, que esmagastes o fraco, em vez de o amparardes? Como suplicais graças, vós que buscastes a vossa recompensa nos gozos da Terra e na satisfação do vosso orgulho? Já recebestes a vossa recompensa, tal qual a quisestes. Nada mais vos cabe pedir; as recompensas celestes são para os que não tenham buscado as recompensas da Terra.”
          Deus procede, neste momento, ao censo dos seus servidores fiéis e já marcou com o dedo aqueles cujo devotamento é apenas aparente, a fim de que não usurpem o salário dos servidores animosos, pois aos que não recuarem diante de suas tarefas é que ele vai confiar os postos mais difíceis na grande obra da regeneração pelo Espiritismo. Cumprir-se-ão estas palavras: “Os primeiros serão os últimos e os últimos serão os primeiros no reino dos céus.”
Segundo Fénelon[3],
          (...) As criaturas que se acham imbuídas dos verdadeiros princípios do Espiritismo vêem unicamente irmãos em todos os espíritas, e não rivais. Os que se mostrassem ciosos de outros grupos provariam existir-lhes no íntimo uma segunda intenção, ou o sentimento do amor próprio, e que não os guia o amor da verdade. Afirmo que, se essas pessoas se achassem entre vós, logo semeariam no vosso grupo a discórdia e a desunião. O verdadeiro Espiritismo tem por divisa benevolência e caridade.  Não admite qualquer rivalidade, a não ser a do bem que todos podem fazer. Todos os grupos que inscreverem essa divisa em suas bandeiras estenderão uns aos outros as mãos, como bons vizinhos, que não são menos amigos pelo fato de não habitarem a mesma casa.
          Os que pretendam que os seus guias são Espíritos melhores que os dos outros deverão prová-lo, mostrando melhores sentimentos. Haja, pois, luta entre eles, mas luta de grandeza d`alma, de abnegação, de bondade e de humildade. O que atirar pedra a outro provará, por esse simples fato, que se acha influenciado por maus Espíritos. A natureza dos sentimentos recíprocos que dois homens manifestem é a pedra de toque para se conhecer a natureza dos Espíritos que os assistem”.
          Em uníssono com Fénelon, S. Vicente de Paulo acrescenta[4]:
          “O Espiritismo deve ser uma égide contra o espírito de discórdia e de dissensão; mas, esse espírito, desde todos os tempos, vem brandindo o seu facho sobre os humanos, porque cioso ele é da ventura que a paz e a união proporcionam.
          Espíritas! Bem pode ele, portanto, penetrar nas vossas assembléias e, não duvideis, procurará semear entre vós a desafeição. Impotente, porém, será contra os que tenham a animá-los o sentimento da verdadeira caridade. Estai, pois, em guarda e vigiai incessantemente à porta do vosso coração, como à das vossas reuniões, para que o inimigo não a penetre. Se forem vãos os vossos esforços contra o de fora, sempre de vós dependerá impedir-lhe o acesso em vossa alma. Se dissensões entre vós se produzirem, só por maus Espíritos poderão ser suscitadas.
          Mostrem-se, por conseguinte, mais pacientes, mais dignos e mais conciliadores aqueles que no mais alto grau se achem penetrados dos sentimentos dos deveres que lhes impõe a urbanidade, tanto quanto o vero Espiritismo. Pode dar-se que, às vezes, os bons Espíritos permitam essas lutas, para facultarem, assim aos bons, como aos maus sentimentos, ensejo de se revelarem, a fim de separar-se o trigo do joio.
          Eles, porém, estarão sempre do lado onde houver mais humildade e verdadeira caridade”.
          Em inspirada peroração completa Dufêtre[5]:
          “Espiritismo! Doutrina consoladora e bendita! felizes dos que te conhecem e tiram proveito dos salutares ensinamentos dos Espíritos do Senhor! Para esses, iluminado está o caminho, ao longo do qual podem ler estas palavras que lhes indicam o meio de chegarem ao termo da jornada: caridade prática, caridade do coração, caridade para com o próximo, como para si mesmo; numa palavra: caridade para com todos e amor a Deus acima de todas as coisas, porque o amor a Deus resume todos os deveres e porque impossível é amar realmente a Deus, sem praticar a
caridade, da qual fez ele uma lei para todas as criaturas”.
[1] - Herculano Pires “O Espírito e o Tempo”- Edicel – 3ª edição.
[2] - Kardec, A. “O Evangelho Segundo o Espiritismo” – Capítulo XX, item 5
[3] - Kardec, A. “O Livro dos Médiuns” – 2ª parte - Capítulo XXXI, tomo XXII, § 2º e 3º.
[4] - Kardec, A. “O Livro dos Médiuns” – 2ª parte - Capítulo XXXI, tomo XXVI,
[5] - Kardec, A. “O Evangelho Segundo o Espiritismo” – Capítulo X, item 18, § 2º.
Autor:
Rogério Coelho (Muriaé/MG)
reside na cidade mineira de Muriaé, situada na Zona da Mata de Minas Gerais. Jornalista por formação, Rogério Coelho já exerceu diversas funções dentro de casas espíritas, desde secretário até diretor do departamento. Atualmente, preside a Sociedade Muriaeense de Estudos Espíritas e prossegue incansável na divulgação do Espiritismo na tribuna e por meio de jornais e vários periódicos espíritas nacionais e estrangeiros, incluindo-se aí “O Clarim”, a “Revista Internacional do Espiritismo”, ambos de Matão-SP, “O Reformador”, da FEB; “Presença Espírita” da Mansão do Caminho, de Salvador; entre outros.
Autor do livro Visão Espírita do Evangelho.

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