a partir de maio 2011

893609

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Platão: A metafísica


“A desgraça, enfim, é o ópio do esquecimento, que buscais com o mais ardente desejo.”
                           (Delphine de Girardin, A verdadeira Desgraça, ESE)
Objetivo: Entender por que Platão é precursor do Cristianismo, o que existe de comum entre Platão e a Filosofia Espíirita, assim como as diferenças e perceber as várias formas de conhecimento até atingir o ser-em-si.
1-Podemos relacionar o mundo platônico das ideias com a pátria espiritual espírita?
O mundo das ideias é uma realidade em si mesma, divina e imutável, que constitui o conjunto das essências e ideias modelos de todas as formas materiais e valores éticos e estéticos, de modo que o mundo fenomênico é um simulacro da única realidade.
A pátria espiritual na concepção espírita não tem relação conceptual com o mundo das ideias, pois o plano espiritual também é fenomênico, dinâmico, está no espaço e no tempo. A concepção de realidade no Espiritismo comporta tanto as dimensões materiais como espirituais, uma vez que há dois elementos gerais do universo, substancias em si mesmas que integrando-se constituem o real: o princípio inteligente e o princípio material.
Desse modo, a totalidade do real se expressa em hipóstases, em planos de existência que variam de características segundo a predominância do elemento material ou espiritual. Naturalmente, nas hipóstases da existência onde o Espírito se expressa na plenitude de sua natureza igualmente transforma a tal ponto o elemento material que o envolve – perispírito -, sofrendo quase que uma transmutação de sua natureza material pela sublimação de seus elementos.
O mundo das ideias, numa perspectiva ética, pode infundir certa aversão ao mundo material, que é entendido como simulacro, como algo menor e que por vezes merece menosprezo. No Espiritismo não há nenhum desmerecimento aos mundos materiais. Eles são entendidos como “as muitas moradas na casa do Pai”, os educandários celestes em que Deus lança as centelhas divinas – os Espíritos – para germinar e desenvolver a sua natureza, e mais ainda, tais mundos materiais concorrem para a harmonia geral de toda a criação.
2- O conceito platônico de ideias inatas é o mesmo abordado em O Livro dos Espíritos? Justifique.
As ideias inatas em Platão estão na base de sua teoria do conhecimento, porque elas justificam o processo de reminiscência em que a alma encarnada pode relembrar a visão que teve das ideias que dão origem a todas as formas sensíveis, portanto, das essências que pairam no mundo das ideias de onde ela partiu.
Nessa perspectiva, as almas, antes de encarnar, tem a visão das ideias originárias. No Espiritismo, a origem das ideias inatas é totalmente outra. Não nega as ideias inatas, mas lhe são atribuídas outra causa.
Pelo fato de o Espírito não se encontrar encarnado, isto é, preso por uma rede sensorial que limita sua capacidade de percepção, não decorre que ele esteja apto a contemplar as altas verdades da existência, pois ele é criado simples e ignorante, e isso quer dizer que tem tudo a fazer e a desenvolver a si mesmo, de modo a aprender a utilizar a razão e a intuição para apreender a essência do real e dos valores. Assim, o Espírito alterna do plano espiritual para o material, em contínuo processo de amadurecimento de suas potências.
Desse modo, a causa das ideias inatas está no trabalho do Espírito no tempo, seja na matéria densa ou não; são o conjunto das aquisições penosamente conquistadas num espaço de tempo que tornam-se-lhe atributos inalienáveis, porque estão relacionados à sua essência. Essas aquisições, em uma nova encarnação, se manifestam como disposições intelectuais ou morais, muitas vezes sem ação da educação e do incentivo do meio, como habilidade admirável para determinada tarefa, como uma facilidade incomum para aprender determinadas disciplinas.
Numa perspectiva ainda mais radical, ou seja, no tocante as origens, a Filosofia Espírita aponta para princípios inatos que não são oriundos do trabalho do Espírito no tempo, tais como: o impulso de transcendência que determina de modo a priori a saga pelo progresso; o sentimento intuitivo e a priori da existência de Deus,que posteriormente recebe formulação conceptual; e a própria estrutura da consciência que traz em si mesma as leis morais e estéticas.
Dizemos a priori, no sentido de que tais impulsos e princípios não são introjetados pela experiência, educação, domesticação ou pelo processo civilizatório, como pretendem algumas filosofias relativistas e encerradas no paradigma antropológico e historicista.
3- Do ponto de vista da moral, a qual nível da caverna corresponde a humanidade hoje? Desenvolva.
O mito da caverna apresenta os diferentes graus de percepção da realidade que a alma encarnada vai alcançando no desenvolvimento de suas potências. Encerrada em si mesma, no torvelinho da imaginação, se relaciona com uma realidade que é mais produzida por si mesma do que de fato percebida; aos poucos abre-se para as coisas visíveis, transpondo lentamente suas imagens mentais para se entreter quase que absolutamente com os objetos. Então, nesses dois primeiros momentos da percepção, a realidade que se apresenta ao Espírito é tão somente o conjunto da suas imagens mentais e das coisas sensíveis. Sua visão não vai além disso, seu pensamento não consegue ultrapassar a fronteira das imagens e das coisas.
Porém, o desenvolvimento da alma continua e entre as exigências da vida sensível a razão se insinua, suas luzes começam a despontar e a alma se apropria do raciocínio dedutivo (dianóia). Então, a luz natural da razão se fazendo presente, a percepção da realidade se transforma, se amplia, e o pensamento rompe o círculo das imagens e das coisas para se ocupar com os objetos matemáticos e os entes de razão. A caverna será superada, ela já não mais limita de modo completo a percepção da alma, que aos poucos se identifica mais com os objetos ideais do que com os sensíveis. Com o desenvolvimento da intuição (noesis), a alma conquista sua faculdade mais elevada, pois a intuição permite a percepção imediata da realidade em si, para além do simulacro e dos fenômenos que mais ocultam a essência das coisas.
Vemos que a alma percorre um longo caminho em que suas potências se afloram até a visão da suprema realidade. Nessa perspectiva platônica, a humanidade contemporânea se encontra no limar da percepção intuitiva, que a colocará em franca relação com a realidade espiritual imanente ao mundo, mas que não é conhecida. Então, será o golpe fatal ao paradigma materialista, ou seja, ao conjunto de ideias que reduz toda a realidade ao princípio material ou que exclui toda e qualquer possibilidade da existência do princípio espiritual. Na verdade, desde a explosão mediúnica nos anos do século XIX, essa realidade espiritual já se faz patente, por suas manifestações, mas poderemos entender como causas exógenas. Por outro lado, a erupção da faculdade intuitiva entre os homens é uma causa endógena, advinda da sua própria constituição.
É necessário explicitar que a intuição também se constitui de inúmeros graus até a visão do Bem. Desse modo, a filosofia da educação em Platão é voltada inteiramente para a alma, no sentido de aprender a ver pelo Espírito e alcançar o estante supremo da contemplação.
4- Busque, com suas palavras, relacionar algumas ideias que justifiquem o fato de Platão ser precursor do Espiritismo.
Allan Kardec, na introdução em O evangelho segundo o Espiritismo, estabelece Sócrates e Platão como precursores da doutrina cristã e do Espiritismo, e isso se justifica porque os filósofos sustentam os seguintes princípios:
  • A pré-existência da alma e sua sobrevivência após a destruição do corpo. A imortalidade da alma é sustentada não como a mera permanência de um princípio anímico em geral, e sim a individualidade indestrutível, ou seja, a consciência que permanece em face da corrupção sensível.
  • A palingenesia como processo de múltiplas gerações ou encarnações em que se realiza a paideia (educação) da alma até a contemplação do Bem absoluto;
  • O Bem absoluto entendido como realidade suprema e, portanto, a fonte dos valores morais e estéticos que, assim, não se reduzem ao relativismo das épocas e das conveniências.
Desse modo, as luzes do monoteísmo, da imortalidade da alma e da sua elevação pelas vidas sucessivas, já são lançadas em grande profusão nas paragens terrenas, pois, como ensina Kardec: “As grandes ideias nunca aparecem de súbito. As que tem a verdade por base contam sempre com precursores, que lhes preparam parcialmente o caminho. Depois, quando o tempo é chegado, Deus envia um homem com a missão de resumir, coordenar e completar o elementos esparsos, com eles formando um corpo de doutrina”. Naturalmente, o Espiritismo é essa síntese dos conhecimentos mais elevados da vida que foram propagados no lento processo civilizatório; reune em si as verdades esparsas e ao que estava confuso e velado, traz a chave da interpretação racional à luz da fenomenologia mediúnica. Não é obra de um homem tão somente, mas dos “Espíritos do Senhor, que são as virtudes dos céus, como um imenso exercito que se movimenta, ao receber a ordem de comando, espalham-se sobre toda a face da terra. Semelhantes as estrelas cadentes, vêm iluminar o caminho e abrir os olhos aos cegos.”
Bibliografia
IEEF. Princípios da filosofia espírita. São Paulo: IEEF, 2012.
KARDEC, ALLAN. O evangelho segundo o Espiritismo. São Paulo: Lake, 2011.
KARDEC, ALLAN . O livro dos Espíritos. São Paulo: Lake, 2010.
KARDEC, ALLAN. A Gênese. São Paulo: Lake, 1999.
MORENTE, M. G. Fundamentos de Filosofia. São Paulo: Mestre Jou, 1970.
PIRES, J. HERCULANO. Introdução à filosofia espírita. São Paulo: Paidéia, 2005.

Nenhum comentário:

Postar um comentário