Observados atentamente os ensinamentos e os exemplos de Jesus,
contidos no Novo Testamento, chega-se à conclusão que o Mestre não fundou
religião alguma. A mensagem cristã é um forte apelo no sentido de reconhecermos
a paternidade divina, mas, ao mesmo tempo, de nos reconhecermos como irmãos.
Jesus apenas propôs que nos amássemos uns aos outros, mostrando-nos que o
caminho para Deus é o próximo, deixando claro que só poderemos demonstrar nosso
amor a Deus amando-Lhe os filhos: “Pois quem não ama a seu irmão, ao qual viu,
como pode amar a Deus, a quem não viu?” (I Jo, 4: 20). Ensinou que a busca de convivência
pacífica entre as criaturas é mais agradável a Deus do que qualquer tipo de
oferenda que Lhe possamos fazer: “Portanto, se trouxeres a tua oferta ao altar,
e aí te lembrares de que teu irmão tem alguma coisa contra ti, deixa ali diante
do altar a tua oferta, e vai reconciliar-te primeiro com teu irmão e, depois,
vem e apresenta a tua oferta.” (Mt, 5: 23 e 24). E, no versículo seguinte,
Mateus registrou outra recomendação referente à convivência: “Concilia-te
depressa com o teu adversário enquanto estás no caminho com ele (...).”
Exemplificou que o “amor ao próximo como a si mesmo” não deveria
ser interpretado apenas como preceito abstrato, demonstrando sua prática
através da “Parábola do Bom Samaritano” (Lc, 10: 25 a 37). Além do mais, deixou
recomendação geral no sentido de se socorrer o próximo, como Ele o fazia: “...
e porão as mãos sobre os enfermos e os curarão.” (Mc, 16: 18).
Jesus nunca disse que ofereceria seu sangue a Deus para salvar a
Humanidade.
Não instituiu culto, ritual ou cerimônia de qualquer espécie.
Não ministrou sacramento algum, nem orientou no sentido que alguém
o fizesse.
Não aconselhou a construção de templos, de lugares especiais à
vivência religiosa, nem a frequência àqueles que existiam. Só fez referência a
um lugar, relativamente à oração: “Mas tu, quando orares, entra no teu
aposento, e, fechando a tua porta, ora a teu Pai que está em oculto; e teu Pai,
que vê secretamente, te recompensará.” (MT, 6: 6)
Não recomendou qualquer tipo de indumentária.
Não estabeleceu classes de servidores.
Não ensinou cânticos ou ladainhas; pelo contrário, advertiu quanto
à repetição inconsciente de uma oração: “Orando, não useis de vãs repetições,
como os gentios, que pensam que por muito falarem serão ouvidos.” (MT, 6: 7).
Jamais recebeu qualquer retribuição material pelo que fazia às
pessoas.
Não usou velas, nem fumaça, nem bebida.
Não deixou fórmulas para serem lidas durante cerimônias.
Não sacralizou lugar algum.
Não ensinou a orar diante de imagens.
Essas práticas, todas estranhas aos ensinamentos e aos exemplos de
Jesus, foram sendo, pouco a pouco, introduzidas no movimento cristão pelos
teólogos e por aqueles que detinham poder no meio religioso que se formou a
partir de então. Além das interpretações tendenciosas e alienantes que
produziram, foram incapazes de coibir o uso de imagens esculpidas e pintadas,
em que os protetores espirituais – chamados anjos – se apresentassem com
aquelas enormes asas.
Esses fatos são constatados sem que se lance acusações sobre
outros, mesmo porque, de acordo com a consciência de imortalidade e de
reencarnação que o Espiritismo suscita aos seus adeptos desenvolverem, ninguém
poderá levantar libelos acusatórios contra aqueles que os antecederam na
romagem terrestre, pois poderia estar acusando a si próprio. Em verdade, quem
poderá, em sã consciência, afirmar que não tomou parte em ações que redundaram
no desvirtuamento das lições de Jesus?
Como é que se conseguiu criar um Inferno de penas eternas, depois
de Jesus ter ensinado tantas vezes que devemos nos perdoar uns aos outros? Por
que teria Jesus contado a sublime “Parábola do Filho Pródigo”, em que põe em
evidencia a virtude do perdão, exercitada por um pai terreno? Estaria o Mestre
incentivando a criatura a ter mais misericórdia maior do que o próprio Criador?
Jesus sabia que haveria uma tendência ao desvirtuamento de suas
lições, por isso deixou algumas recomendações: Quanto ao isolamento em
comunidades apartadas do convívio social: “Eis que vos envio como ovelhas no
meio de lobos (...)” (Mat, 10: 16). Essa recomendação foi também registrada por
outro Evangelista: “Ide: eis que vos mando como cordeiros ao meio de lobos.” (Lucas,
10: 3)” E quanto ao profissionalismo religioso, deixou recomendação muito
clara: “... de graça recebestes, de graça dai.” (Mat, 10:
4)
Sabendo disso, é que precisamos, mais do que nunca, do exercício
consciente do “Vigiai e orai para não cairdes em tentação (...)” Mat, 16: 41,
recomendado por Jesus. Devemos ter em mente que o Mestre nos enviou o
Espiritismo na condição de o Consolador prometido: “Vos enviarei o consolador,
que vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar de tudo o que tenho dito.”
Se bem interpretarmos essas palavras, registradas por João, nos
capítulos 14 e 16 do seu Evangelho, veremos ali as duas vertentes principais do
Espiritismo: o retorno aos ensinamentos e aos exemplos de Jesus, e os
esclarecimentos que Ele não pudera dar, por falta de maturidade das pessoas
àquela época.
José
Passini
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