a partir de maio 2011

sexta-feira, 20 de abril de 2012

O cirurgião e a doença da negação


LUIZ CARLOS FORMIGA  formigalcd@hotmail.com
Rio de Janeiro, RJ (Brasil) 

Nas palavras do neurocirurgião Paulo Niemeyer, Claudio Leite (1) era o maior cirurgião infantil do país. Lança, pela Editora Lacre, um livro sobre a “doença da negação”, através da qual passou por dores extenuantes. Ele diz que está se expondo. No entanto, o benefício que o livro pode trazer aos que passam pela mesma doença, e ainda não se identificaram com ela, compensa a quebra do anonimato.

O médico, hoje com 83 anos, confessa que se julgava acima de tudo. Agnóstico, orgulhoso e prepotente, não queria entender que era portador de uma doença que iguala a todos.

“No AA, você vê juiz ao lado do rapaz de 17 anos que roubou carro para o tráfico.”

“Eu vivia trancado no quarto, sem tomar banho, bebendo vodca.”

“Em 1978, tive um infarto. Não quis ficar internado, porque não poderia beber.
Fui para casa e bebia uma garrafa e meia de uísque por dia, infartado.”

Em 1997, com 68 anos, no dia 11 de novembro, seu filho lhe deu uma última chance de tratamento: “tome banho e venha comigo”. Claudio diz que tem uma gratidão eterna pelo AA, pois perdeu muito tempo bebendo a própria vida. Está sóbrio desde então.

Recentemente, estive num Seminário sobre Dependência Química, no Rio de Janeiro. Comecei a pequenina participação com um “Se Beber Não Opere” e terminei com o depoimento da “esposa de um dependente” (2).

Claudio diz que “procurava não beber na véspera da cirurgia e nunca entrou num centro cirúrgico bêbado”. Por outro lado percebia as mãos trêmulas. “Um dia, com o paciente já na mesa de cirurgia, liguei para o meu assistente e disse que não tinha condições.”

Tudo começou tomando um uisquinho à noite, para relaxar e descontrair. “Hoje trabalhei muito, mereço.” Todos começam bebendo moderadamente e nem percebem a doença de progressão lenta. Difícil, depois, reconhecer que se está bebendo demais.

A mulher já não falava mais com ele e durante dez anos não dormiram juntos.

O doente gosta de quem não fica dizendo: “não beba”. Por isso, vai ao motel e fica 2 ou 3 dias com prostituta, para beber. Ainda encontramos associado ao álcool mais de 60 doenças secundárias, o que não é dito na mídia.

“Durante anos sofri e me destruí, destruí minha família, minha profissão e cheguei à solidão extrema e à completa desmoralização.”

Depois de 20 anos de escravidão, o médico aos 68 anos encontra o AA e desde então são 14 anos sóbrio. O final poderia ser diferente. Conta ele que tinha mania de arma, fez tiro ao alvo. Um dia o filho tirou tudo de casa, porque ele estava com a intenção de dar um tiro na cabeça.

Hoje escreveu “Alcoolismo – A Doença da Negação”. Seu lançamento será adiante. Certamente ajudará doentes, que ainda não perceberam a própria condição, a dar o salto de qualidade, da consciência de sono à desperta/lúcida.

O alcoolismo é uma dependência química que afeta os componentes físico, mental e espiritual. “Espiritualidade não é religiosidade”, diz o médico.

Religião, religiosidade e espiritualidade já são discutidas em pós-doutorado. Precisamos examinar essa tese, sem preconceito.


Fontes:

Nenhum comentário:

Postar um comentário