Embora muitos não concordem, consideramos a doutrina de Roustaing, que admite o corpo fluídico de Jesus, também tem uma deturpação do Espiritismo. E por que não dedicamos a ela um capítulo especial, na primeira edição de "Pureza Doutrinária", que saiu em 1988? Porque não penetráramos ainda, com profundidade, no assunto e não assimiláramos o pensamento de Herculano Pires: "A posição científica Kardec opõe-se à posição vulgar de Roustaing - um horrível vaidoso que se deixa levar pelos Espíritos mistificados aceitando as explicações mais ridículas e absurdas para esclarecimento de problemas escriturísticos. O grande advogado não passava de um grande ingênuo". (O Verbo Carne, Edição Cairbar, página 56, 1973).
1 - Breve histórico
Jean-Baptiste Roustaing era advogado e nasceu em Bordeaux (França). Foi assessorado pela médium Emile Collignon, que lhe transmitiu comunicações mediúnicas atribuídas aos quatro evangelistas (Mateus, Marcos, Lucas, João), cada qual comentando seu Evangelho, tudo dirigido por Moisés. Roustaing publicou sua obra em 1866, intitulada "Quatro Evangelhos", com o subtítulo "Espiritismo Cristão Revelação da Revelação".
No segundo século da era cristã, surgiu dentro cristianismo a doutrina do docetismo. Ensinava ela que o corpo de Cristo não era material, e sim aparente e ele não teria nascido como os homens em geral. No século IV, Apolinário de Ludicéia, dizia que Jesus não nascera de Maria, não sofrera e só morrera na aparência.
Roustaing traz de novo essas idéias. Se, como pretende "Os Quatro Evangelhos" fossem comentados agora pelos próprios evangelistas, constituiriam uma obra de altíssimo valor, que viria reforçar a Codificação. Mas as contradições e erros são tão grandes que têm prestado um desserviço ao Espiritismo. Por isso, é profundamente lamentável que a Federação Espírita Brasileira dê tamanho valor a essa doutrina desagregadora.
No Brasil, os "Quatro Evangelhos" foram introduzidos por Antônio Luiz Sayão, do Grupo Ismael (RJ), fundado em 1880. Foi ele precursor da Federação Espírita Brasileira (F.E.B.), que veio a defender ardorosamente o roustainguismo, através das palavras e ações de todos os seus presidentes: Guillon Ribeiro, Wantuil de Freitas, Armando de Assis, Francisco Thiesen e Juvanir Borges de Souza. Fecharam eles os espíritas ingênuos numa gaiola de ouro: nenhuma pessoa poderia ter cargo diretivo se não fosse roustainguista.
Ismael Gomes Braga, dirigente da FEB, em seu livro "Elos Doutrinários" culpa os kardecistas pelo fracasso do movimento espírita francês: "Nos lugares onde os inimigos visíveis e invisíveis de Roustaing venceram a campanha que maquinaram, o Espiritismo e Kardec entraram em declínio e, ou desapareceram totalmente, ou estão adormecidos. Está demonstrado, pois, que atacar a obra de Roustaing é, de fato, atacar e minar o edifício todo da Terceira Revelação, lançar o descrédito sobre a fonte mesma do espiritismo." ( ... )"Não nos iludamos com esses pretensos defensores de Kardec. Eles são os únicos inimigos perigosos do espiritismo, por isso que se dizem espíritas, escrevem e falam em nome da Doutrina e ardilosamente lhe vão minando os alicerces eternos: os Evangelhos e a Mediunidade". Para ele, os livros de Roustaing são um curso superior de Espiritismo.
Luciano dos Anjos, em artigo publicado no "Reformador", órgão da FEB, em 1973, afirma que a FEB é uma instituição extraterrena, nada mais sendo do que uma projeção de sua verdadeira sede que está no alto. Francisco Thiesen, ex-presidente da FEB, no "Reformador"de abril de 1987, diz que "Kardequizar é sectarizar".
O "Reformador", como se vê, sempre foi o porta-voz dos roustainguistas da FEB. Há cerca de 8 anos, em manobra política, a FEB levou, para vice-presidentes, dois espíritas paulistas, de enorme valor e dignidade, ambos kardecistas. Esperávamos que eles conseguissem abrandar, se não as idéias, pelo menos as táticas roustainguistas, mas estamos vendo que não o conseguiram, ou não quiseram. A FEB passou a assediar, por meios os mais variáveis, as poucas Entidades, como a USE-SP que se mantinham fora de seus domínios. Esperemos seu novo vôo, rumo ao Conselho Espírita Internacional.
2 - Afirmações de Roustaing
Baseei-me nas seguintes fontes:
Durval Ciamponi, em seu excelente livro "Alternativas da Humanidade (Na era do Espírito)", Edições FEESP, 1996, faz um estudo resumido das 'teses roustainguistas'. Gélio Lacerda da Silva aborda longamente o assunto, no seu livro "Conscientização Espírita", Editora Opinião E, 1995. Wilson Garcia já havia sido muito feliz na pesquisa para "O Corpo Fluídico", Editora Correio Fraterno, 1987. E não nos esqueçamos do livro que fez furor em 1973: "O Verbo e a Carne", de Herculano Pires e Júlio Abreu Filho. Em 1999, Nazareno Tourinho publicou uma excelente crítica: "As Tolices e Pieguices da Obra de Roustaing", Correio Fraterno.
Vamos então, às principais afirmações do livro "Os Quatro Evangelhos".
1 - Jesus, sendo um Espírito Crístico, não teve um corpo carnal, mas um corpo fluídico, com todas as aparências de matéria.
2- A gravidez de Maria foi aparente: "Foi obra do Espírito Santo (noção católica), porque foi obra dos Espíritos do Senhor e, como tal, aparente e fluídica, de maneira a produzir ilusão, a fazer crer numa gravidez real". Quer dizer: Maria participou de uma grande farsa. "Os espíritos prepostos à preparação do aparecimento do Messias na Terra reuniram em torno de Maria fluidos apropriados que lhe operaram a distensão do abdômem e o entumesceram." ( ... )"Seu parto foi igualmente obra do Espírito Santo, porque também foi obra dos Espíritos do Senhor e só se deu na aparência, tal como a gravidez." Vejam-se o misticismo e a arrogância, fazendo os "Espíritos do Senhor" virem fazer os partos aqui na Terra ...
3 - O leite mamado por Jesus era devolvido pelos espíritos ao sangue da mãe, sem que ela o soubesse.
4 - O corpo fluídico justifica atos da vida de Jesus, como andar sobre as águas e desaparecer do sepulcro.
S - Os Espíritos crísticos, puríssimos, não podem encarnar, por isso, Jesus não poderia ter corpo de matéria.
6 - Tudo, na vida de Jesus, foi apenas aparente, havendo ilusão para todos os que o seguiam.
7- Deveria vir o "Espírito Regenerador", representando o Consolador prometido por Jesus, com o papel do Espírito Santo da Igreja Romana. Esta afirmação reduz a zero a universalidade da missão do Espiritismo e as manifestações mediúnicas. "Os vossos médiuns só entrarão no gozo completo de suas faculdades medianímicas quando estiver entre os homens o Regenerador, Espírito que desempenhará a missão superior de conduzir a humanidade ao estado de inocência, isto é, ao grau de perfeição a que ela tem de chegar". ( ... )" Debaixo da influência e da direção do Regenerador, caminha o chefe da Igreja Católica, a qual será, então, católica na legítima acepção desse termo, pois estará em vias de tornar-se universal, como sendo a Igreja de Cristo."
8 - Afirmam os seguidores de Roustaing que Humberto de Campos enfatiza a participação dele na obra da Codificação.
"O Mundo Maior decidiu que Kardec contaria com a coordenação de uma plêiade de auxiliares de sua obra, designados particularmente para coadjuvá-lo, nas individualidades de Jean-Baptiste Roustaing, que organizaria o trabalho da fé; de Léon Denis, que efetuaria o desdobramento filosófico; de Gabriel Delanne, que apresentaria a estrada científica; e de Camille Flammarion, que abriria a cortina dos mundos."
9 - Vem agora o absurdo dos absurdos, defendido por Roustaing. Trata-se dos "criptógamos carnudos". Para ele, os espíritos "ateus" sofrem o castigo da primitiva encarnação humana, transformando-se em larvas, que Roustaing denomina "criptógamos carnudos". Seriam uma espécie em que se encarnam espíritos humanos que regrediram aos planos vegetal e animal. Em Botânica, criptógamos é o termo usado para designar os vegetais que possuem órgãos reprodutores ocultos. O acréscimo "carnudo" faz lembrar músculos, carne, e por isso, os remete ao reino animal. Nesses seres encarnariam espíritos humanos que regridem ao reino vegetal ou animais extremamente elementares.
Roustaing assim os descreve: "São corpos rudimentares. O homem aporta a essas terras no estado de esboço, como tudo que se forma nas terras primitivas. O macho e a fêmea não são nem desenvolvidos, nem fortes, nem inteligentes. Mal se arrastando nos seus grosseiros invólucros, vivem, como os animais, do que encontram no solo e lhes convenha. As árvores e o terreno produzem abundantemente para a nutrição de cada espécie. Os animais carnívoros não os caçam. A previdência do Senhor vela pela encarnação de todos. Seus únicos instintos são os da alimentação e os da reprodução".
No livro "O Verbo e a Carne", na página 43, Herculano Pires comenta: "Essa é a revelação da revelação. Roustaing copia e desfigura Kardec, acrescentando aos seus ensinos os maiores absurdos. Note-se que essas criaturas estranhas, em forma de larvas e lesmas, são encarnação de espíritos humanos que haviam atingido alta evolução sem passar pela encarnação humana. Depois de desenvolverem a razão em alto grau e de haverem colaborado com Deus nos processos da Criação, chegando mesmo a orientar criaturas humanas, voltam à condição de criptógamos carnudos.
Mas por que falam os reveladores em substâncias humanas? Por que não simplificam as coisas dizendo simplesmente que esses espíritos decaídos vão encarnar-se em lesmas? Por que é preciso enganar os espiritistas que aceitam Kardec e sabem que a evolução espiritual é irreversível, que o espírito humanizado não pode regredir ao plano animal?"
Encontramos em Léon Denis, "Depois da Morte", 9º edição, FEB, página 124: "A alma se elabora no seio dos organismos rudimentares. No animal, está apenas em estado embrionário: no homem adquire o conhecimento e não pode mais retrogradar".
Os antigos egípcios e outros admitiam quc a alma humana pode reencarnar em corpo de animais como punição a falhas cometidas. Nisto consiste a metempsicose, não aceita pelo Espiritismo, que só admite reencarnação em corpos humanos. A metempsicose é esclarecida por Kardec, em "O Livro dos Espíritos", perguntas 611, 612 e 613.
3 - Refutação de Roustaing
O combate às idéias de Roustaing já é antigo: Deolindo Amorin e Carlos Imbassahy, no Rio de Janeiro, nas décadas de 1950 e 1960; José Herculano Pires e Júlio Abreu Filho, de 1960 a 1975 (em São Paulo); mais recentemente, Durval Ciamponi e Gélio Lacerda da Silva, de Vitória, ES, que publica "Conscientização Espírita", EME editora, 1995, livro claro, didático e muito corajoso.
Vamos tentar refutar, item por item, os argumentos falaciosos dos roustainguistas, mas nada melhor do que iniciar citando os ensinos poderosos do Codificador, que constituem nosso esclarecimento, nossa luz, nosso farol. Representam não a opinião sem validade de um homem, fanatizado e presunçoso, que quer impingir suas idéias como se fossem os ensinos dos quatro evangelistas, mas sim, a opinião coletiva de Espíritos de alta evolução, que trouxeram a Doutrina Espírita.
1- Corpo Fluídico . Vejamos o que diz "A Gênese"· Capítulo XV . item 65: "A permanência de Jesus sobre a Terra apresenta dois períodos: aquele que precede e aquele que segue sua morte. No primeiro, desde o momento da concepção até o nascimento, tudo se passa com sua mãe como nas condições comuns da vida. A partir do nascimento até sua morte, tudo em seus atos, sua linguagem e nas diversas circunstâncias de sua vida, apresenta os caracteres inequívocos de sua corporeidade. Depois de sua morte, ao contrário, tudo revela nele o ser fluídico. A diferença entre os dois estados é tão fundamentalmente traçada que não é possível assemelhá·las ...
A coesão não existe nos corpos fluídicos; a vida, neles não repousa no funcionamento de órgãos especiais e neles não se podem produzir desordens análogas; um instrumento cortante em qualquer outro, ali penetra como num vapor, sem lhe ocasionar lesão alguma. Eis porque os seres fluídicos designados por agêneres não podem ser mortos.
Depois do suplício de Jesus, seu corpo lá ficou, inerte e sem vida; foi sepultado como os corpos comuns, e todos puderam vê-lo e tocá·lo. .. Se Jesus pôde morrer, é que tinha corpo carnal".
Vamos agora ao livro "Obras Póstumas", de Kardec, capítulo V - Dupla natureza de Jesus, página 105: "O que devia ser humano em Jesus era o corpo, a parte material, e neste ponto de vista, compreende-se que ele tenha sofrido como homem". No capítulo VIII desse livro, Kardec lembra João I, 1 a 14: "E o verbo se fez carne e habitou entre nós; e vimos a sua glória, como filho unigênito do Pai, cheio de graça e verdade". "Jesus podia, pois, ser encarregado de transmitir a palavra de Deus sem ser Deus, como um embaixador transmite as palavras do seu soberano, sem ser o soberano."
Ainda em ''A Gênese" - Capítulo XV - item 2, diz Kardec:
"A superioridade de Jesus sobre os homens não era relativa às qualidades particulares do seu corpo, mas às de seu Espírito, que dominava a matéria de maneira absoluta, e ao seu perispírito alimentado pela parte mais quintessenciada dos fluidos terrestres".
Perante afirmações tão categóricas da Codificação, é de se admirar que os dirigentes da FEB teimem em negar que Jesus tenha tido um corpo material.
2 - O leite mamado por Jesus - A aceitação de que ele era devolvido pelos espíritos ao sangue da mãe é de um absurdo verdadeiramente irritante. Mais tarde, quando jovem e adulto, ele se alimentava como as outras pessoas. O que acontecia com esses alimentos? Seriam desmaterializados? Por que recorrer a hipóteses estapafúrdias? Será desonroso crer que ele tinha um corpo orgânico como o nosso?
3 - Andar sobre as águas - Não é preciso recorrer à fé para aceitar que Jesus pairasse acima das águas, mesmo tendo corpo material. Em "A Gênese" - capítulo XIV - item 42, encontramos: "Jesus, mesmo vivo, pôde aparecer sobre a água sob uma forma tangível, enquanto seu corpo carnal se encontrava alhures; é a hipótese mais provável".
Kardec escrevia e os Espíritos ensinavam, há 150 anos. Mas ele mesmo insistia em que "o Espiritismo caminhará com a ciência". E caminhou. A própria física moderna trouxe-nos explicações, impossíveis naquela época, e que hoje são banais, citando ocorrências em que a força de atração da gravidade é vencida. Assim é que, dentro dos "sputniks", os astronautas flutuam no ar.
4-Desaparecer do sepulcro - Hoje há numerosos trabalhos, livros e revistas que tratam do "fenômeno de transporte". Citemos o mais importante deles: "Fenômenos de Transporte", Ernesto Bozzano, 2ª edição, FEESP, 1982, prefácio de Deolindo Amorin. Nele Bozzano, grande sábio italiano e que escreveu numerosas obras espíritas, estuda com grande agudeza o assunto, citando fenômenos obtidos em plena luz. Se os Espíritos podem efetuar transporte de objetos e alguns médiuns podem levitar, por que Jesus, com seu enorme poder sobre a matéria não poderia fazê-lo?
5-Espíritos puríssimos não podem encarnar - Encontramos em A Gênese", capítulo XIV - item 9, o seguinte:
"Os Espíritos superiores podem vir aos mundos inferiores e mesmo aí se encarnar. Dos elementos constitutivos do mundo em que entram eles extraem os materiais do envoltório fluídico ou carnal apropriado ao ambiente onde se encontram. Fazem como grande senhor que deixou suas belas roupas para vestir-se momentaneamente com trajes plebeus, sem que, por isso, deixe de ser grande senhor. É assim que Espíritos das ordens mais elevadas podem se manifestar aos habitantes da Terra, ou encarnar-se entre eles, em missão". "Os Espíritos chamados a viver naquele meio dele extraem seu perispírito; mas conforme seja o próprio Espírito mais ou menos purificado, seu perispírito se forma de partes mais puras ou mais grosseiras do fluido próprio ao mundo no qual se encarna."
Durval Ciamponi, no livro "Alternativas da Humanidade", esclarece à página 98: "Quando um Espírito superior encarnar entre os homens na Terra, seu perispírito será mais sutilizado que dos aborígenes. A natureza do envoltório fluídico está sempre em relação com o grau de adiantamento moral do Espírito".
Aqui entram os roustainguistas com uma novidade: "Há mundos fluídicos, destinados à habitações de espíritos que, desde o estado de infância e instrução, nunca faliram, e que, conservando-se sempre puros na senda do progresso, progridem no estado fluídico. Mundos materiais - Diversos mundos destinados à encarnação dos espíritos falidos e, como tais, sujeitos à encarnação humana". (Citação de Herculano Pires).
Fantasia que divide os espíritos entre pobres e plebeus; os protegidinhos que nunca "pecaram" (isto só aconteceria se fossem liberados das provas) e aqueles que, jogados em ambientes desfavoráveis, teriam tido seus fracassos. Esquecem a grande Lei da Evolução, que nos mostra que os mundos fluídicos representam a fase superior do desenvolvimento dos mundos materiais.
6-Tudo na vida de Jesus, foi apenas aparente - Durval Ciamponi responde por mim: "Se tudo nele era só aparência, todos os atos de sua vida, o anúncio reiterado de sua morte, a cena dolorosa do Jardim das Oliveiras, sua oração a Deus para que alistasse o cálice de seus lábios, sua paixão, sua agonia, tudo, até seu último grito no momento de entregar o Espírito, não teria sido senão um vão simulacro para enganar com relação à sua natureza e fazer crer no sacrifício ilusório de sua vida, uma comédia indigna de um homem honesto e simples, quanto mais, e por mais forte razão, de um ser também superior, numa palavra teria abusado da boa fé dos seus contemporâneos e da posteridade". (página 99)
7-Jesus não sofreu dor física, somente dor moral
Roustaing não deixa dúvidas quando afirma que Jesus não sofreu dores físicas ou orgânicas e que seu sofrimento foi apenas moral. Reconhecemos que a dor moral tenha sido bem maior que a dor corporal, dado o comando que tinha sobre a matéria. Não precisaria sofrer a dor material, que é, para os homens, a oportunidade de resgate e útil para a evolução.
O sofrimento de Jesus foi perante a ignorância e incompreensão do povo e até de seus seguidores mais próximos. Não perceberam a grandiosidade de sua missão. Esperavam um salvador guerreiro e não um ser dizendo que "meu reino não é deste mundo". "Se, quando vos falo das coisas terrenas, ainda assim não credes, como creríeis se eu vos falasse das celestiais?"
Em Mateus, 17: 17, encontramos: "ó geração incrédula e perversa! Até quando estarei convosco? Até quandos vos sofrerei?"
"Havendo, pois, Cristo padecido na carne, armai-vos também vós outros desta mesma consideração: que aquele que padecer na carne cessou seus pecados." (l ª Epístola de São Pedro - Capo 4-1)
8- Espírito Regenerador - Roustaing se coloca na posição daqueles crentes de outras religiões que ainda esperam a vinda do Messias prometido, restringindo o valor da missão de Jesus, que precisa ser completada por outros Messias. Para os espíritas, o Consolador prometido já veio e é o Espiritismo.
9-Brasil, Coração do Mundo- "A colocação de Humberto de Campos sobre "Brasil, Coração do Mundo" era, também um pouco emocional-libertária, porque os Espíritos não têm pátria; sua pátria é o Universo (Bahia Espírita, FEEB, Ano XVI, nº 68, Set. - Out. ,1985). Divaldo: "A expressão 'Pátria do Evangelho' não é da Doutrina Espírita. Está inserta numa obra de Humberto de Campos e trata-se de uma colocação emocional do literato que ama sua pátria". (Conscientização Espírita)
Avaliação da "Revelação da Revelação"
Herculano Pires, em "O Verbo e a Carne", à página 56, pergunta: "Quais os motivos da penetração de Roustaing no Brasil? Como e por que ele conseguiu enraizar-se na chamada 'casa mater'? Por que nos defrontamos agora com uma recrudescência dessa pseudo-doutrina? Parece-nos que tudo se resume numa questão de formação religiosa, tendo por fundo a formação nacional brasileira e o período medieval do nosso desenvolvimento nacional. O roustainguismo chegou ao Brasil num momento crítico, quando a nossa cultura estava sendo abalada por várias infiltrações européias. Entre essas, o Espiritismo, que chegara da Franca e empolgara alguns espíritos cultos na segunda metade do século XIX. O roustainguismo se apresentou como integrado ao Espiritismo e tocava de perto a sensibilidade mística de alguns ex-católicos. A obra trazia um grande alívio aos espíritas místicos, pois quebrava a frieza racional da obra de Kardec e restituia ao Cristo a sua condição sobrenatural.
Para homens profundamente religiosos, como Bezerra de Menezes, Antônio Luiz Sayão, Bittencourt Sampaio e outros, cujos escritos atestam o predomínio do sentimento religioso sobre a razão crítica, a obra de Roustaing surgia como uma tábua de salvação, livrando-os do racionalismo kardeciano. Era a volta ao maravilhoso, ao Cristo místico, divino no espírito e no corpo. Dessa maneira, Roustaing devolvia a essas criaturas as ilusões perdidas da religião lírica que as embalara desde a infância.
Não é fácil compreendermos hoje o clima religioso em que o Espiritismo se desenvolveu entre nós. Houve, naturalmente, a dissidência racionalista, constituída por elementos que tendiam para o aspecto racional da doutrina. Daí a divisão acentuada por Canuto de Abreu (na FEB) entre espíritas místicos e científicos".
Essas são as explicações racionais e imorredouras de Herculano Pires, esse grande pensador espírita, que eu não poderia deixar de citar, fazendo-as minhas.
No Esboço Histórico da Federação Espírita Brasileira, publicado em 1911, são citados os confrades que, no dia 1 º de janeiro de 1884, fundaram uma "sociedade para estudo científico do espiritismo", incorporando o jornal "O Reformador", que vinha sendo editado por Elias da Silva. Veja-se o objetivo desta Federação (mudado depois).
Anjo Ismael - Nos centros Espíritas do Rio de Janeiro, antes da Fundação da FEB, havia referências ao "Anjo Ismael", que se transferiu definitivamente para a FEB, tendo como uma das mais importantes finalidades incentivar o estudo dos Quatro Evangelhos. Propuseram que a designação dos dirigentes fosse feita pelos Espíritos, em cada sociedade espírita. Esqueciam-se eles de que a tarefa dos Espíritos é instruir-nos e aconselhar-nos, não se trasnformar em cabos eleitorais. Entretanto, não se tomou conhecimento do que consta nas "Obras Póstumas" de Kardec.
Antes de vir para a FEB, o "luminoso espírito de Ismael", para substituir o primitivo Grupo Confúcio, fundado em 1873, criou a "Sociedade Deus, Cristo e Caridade", criada a 23-3-1876 e dirigida por Bittencourt Sampaio. O Grupo Ismael também se incorporou à FEB. Foi então que a FEB tomou os Quatro Evangelhos como guia máximo no Espiritismo, de valor superior à Codificação, pois os ensinos recebidos proviriam diretamente dos próprios evangelistas, assistidos por Moisés.
A 3 de agosto de 1885, é guindado à presidência da FEB o grande espírita, médico e político dr. Adolpho Bezerra de Menezes; respeitado por todos, veio a acabar com a luta entre místicos e científicos, pacificando a Federação. Desencarnou a 11 de agosto de 1900.
Após Bezerra, pacificador e tolerante, o roustainguismo passou a imperar na FEB; para ser dirigente ou conselheiro, era preciso ser roustainguista. A FEB proibia a realização de qualquer Congresso, no Brasil, sem seu consentimento. Mas em alguns Estados (São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul, principalmente) começou-se a esboçar a libertação da ditadura febiana. Assim realizou-se, de 31 de outubro a 5 de novembro de 1948, o Congresso Brasileiro de Unificação, patrocinado pela então corajosa USE e combatido pela FEB.
Em abril de 1962, na cidade de Curitiba, realizou-se o 1 º Simpósio Espírita Centro-Sulino, com a presença das delegações de São Paulo, Paraná, Guanabara, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Tomaram-se resoluções importantes para a condução do movimento espírita no Brasil. Enfatizou-se o aspecto tríplice da Doutrina: aspectos de ciência, filosofia e religião. Alertou-se o meio espírita brasileiro "acerca da diluição progressista da conceituação doutrinária, a que os trabalhos dos movimentos paralelos podem, conscientemente ou não chegar". (...) "O espírita deve evitar a adesão irrefletida ou menos avisada a movimentos ou produções literárias que direta ou indiretamente colidam com o momento espírita .
O Pacto Áureo - A 5 de outubro de 1949, realizou-se, no Rio de Janeiro, o acordo geral visando a unificação do Espiritismo no país e a criação de um Conselho Federativo Nacional apoiado por espíritas de todo o Brasil. Não foi apoiado por pensadores isolados como Herculano Pires, que escreveu: ''A USE submeteu-se ao Conselho Federativo Nacional, órgão da FEB. A reforma estrutural da USE suicida-se num pacto de ouro, entregando-se aos rabinos do Templo". (Jornal Mensagem, dezembro de 1976)
Todos nós nos entusiasmamos com o Pacto. Esperávamos um Conselho Federativo realmente representativo de todo o Brasil, autônomo, funcionando com toda liberdade e sem compromissos com Roustaing. Não percebemos que ele era um Departamento da FEB e, como tal, a ela subordinado. Não víamos que um Conselho, representando democraticamente todas as Federações estaduais, não poderia ser subordinado a uma Federação criada e dirigida por moradores do Rio de Janeiro, intitulada "brasileira", mas sucessora de um só centro espírita.
Uma Federação dos Sindicatos dos Metalúrgicos do Brasil precisa ser formada pela união dos sindicatos de todos os Estados em Assembléia para tal convocada. Tal Federação não pode ser departamento de um Sindicato.
Uma Associação Médica Brasileira é formada por Associações dos vários estados, as quais são a ela subordinadas. Não se concebe a AMB como departamento de uma Associação Estadual.
A Confederação Brasileira de Futebol resulta da união das federações estaduais de futebol. Não teria cabimento a CBF ser um departamento do São Paulo Futebol Clube, ou do Vasco da Gama.
Pois bem. O Conselho Federativo Nacional, que congrega as entidades espíritas de todos os Estados do Brasil, é subordinado à FEB. Seus membros não têm a menor autonomia. Seria triste, se não fosse ridículo.
Terminamos este capítulo com as corajosas palavras de Herculano: "É dever dos espíritas sinceros combater a mistificação roustainguista neste alvorecer da Era Espírita no Brasil. Ou arrancamos o joio da seara ou seremos coniventes na deturpação doutrinária, que continua maliciosamente a ser feita. O Cristo agênere é a ridicularização do Espiritismo, que se transforma num processo de deturpação mitológica do Cristianismo. A doutrina do futuro nega-se a si mesma e mergulha nas trevas mentais do passado. O homem espírita verdadeiro e esclarecido converte-se no homem da era ante-cristã, no crente simplório das velhas mitologias". (O Verbo e a Carne, página 60)
Esta é a nossa posição, apoiado nas Obras Básicas de Allan Kardec e nos estudos de seus mais fiéis seguidores, contra o roustainguismo, uma das piores deturpações do Espiritismo.
Ary Lex foi professor titular de Biologia Educacional e Biologia I da Universidade Mackenzie por 15 anos. Nessas áreas escreveu "Biologia Educacional" (com 20 edições) e "Hérnias", adotado em faculdades de medicina de todo o país. Como orador e escritor espírita foi sempre intransigente defensor dos princípios doutrinários, não se recusando às polêmicas quando se tratava de defender suas idéias de pureza da doutrina. Escreveu muitos artigos na imprensa espírita e publicou as seguintes obras: "Pureza Doutrinária", "Do sistema nervoso à mediunidade", "60 anos de Espiritismo no Estado de São Paulo" (nossa vivência), tendo ainda participado em vários boletins da AMESP
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