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sábado, 14 de maio de 2011

24 horas de luta pela vida

Médicos lutam para realizar transplantes e salvar 3 vidas
São José do Rio Preto, 14 de Maio, 2011 - 2:10,Allan de Abreu


Saúde

› 24 horas de luta pela vida
São José do Rio Preto, 14 de Maio, 2011 - 2:10
Médicos lutam para realizar transplantes e salvar 3 vidas
Allan de Abreu

Hamilton Pavam

Equipe médica durante retirada do fígado de Clarice; ao fundo, especialistas monitoram Jandira, que irá receber o órgão Vida e morte se entrelaçam no centro cirúrgico do Hospital de Base (HB), em Rio Preto. Ao ponto de mortos alongarem outras vidas. A ligação entre um e outro é feita por um exército de mais de 40 médicos e enfermeiros, que se mobilizam por quase 24 horas com um objetivo em comum: esticar a vida de doentes condenados.

Ontem, vivos e mortos ficaram separados apenas por uma fina parede com janela envidraçada. Em uma sala, repousa o corpo, aberto no peito, da faxineira Clarice Massaio, 49 anos, morta em decorrência de um tumor fulminante no cérebro. Na outra, a menos de três metros, bate o coração de Clarice, mas no peito de outro, o aposentado Olívio de Souza Lima, também com 49 anos. Já o fígado da faxineira está mais distante, a três salas de distância, dentro de Jandira Ferreira Mota, 52 anos.

Clarice morreu, mas estranhamente trouxe esperança de vida para outros três pacientes à beira da morte, incluindo Olívio e Jandira. Depois de dois infartos nos anos 90, o coração estava fraco, quase parando. Foram 90 dias na UTI do HB, à espera de um novo coração, única chance de permanecer vivendo. Tanto tempo de espera desanimaram Olívio. “Ele já havia entregue os pontos”, diz Odete Souza Lima, 55 anos.

Em Araraquara, Jandira passou a sofrer de hepatite em junho do ano passado. A doença se agravou aos poucos, e há uma semana foi transferida para o HB, à espera de um fígado. O quadro clínico dela piorava a cada dia, até que, na quinta à noite, entrou em coma.

Mas Clarice morreu às 0h30 de ontem, vítima de meningeoma, um tumor cerebral. E seu destino se cruzou com o de Olívio e Jandira. Quando descobriu a doença, há seis meses, a faxineira reuniu a família e deixou claro o desejo de doar todos os órgãos. “A gente conversou bastante e ela disse que queria salvar vidas, então nós concordamos porque é uma atitude muito bonita”, disse o tio, Alcides Macio, 73 anos.

A notícia de que havia um coração disponível animou Olívio. “Antes de ir para a cirurgia, ele só disse ‘glória a Deus’,” lembra outra irmã, Maria Elizabete de Lima Casemiro. Já sedado, Olívio foi direto para a sala 16, onde, separada por uma parede, estava o corpo de Clarice, já aberto pelos médicos na altura do peito. Jandira foi transferida para a sala 19, mais ampla.

O coração foi o primeiro órgão a ser retirado, às 13h45. Momento de agito na equipe médica. “Vai dois aspiradores”, diz um deles. “Rápido, põe o dedo, vai perder a solução. Cadê a tesoura?”, pergunta outro. O coração é colocado em uma pequena bacia e levado para a sala ao lado, onde o peito de Olívio já está aberto, e sem o coração doente - a circulação do sangue é feita fora do corpo, por uma máquina. O órgão é preparado e, vinte minutos depois, vai para o peito do aposentado.

Enquanto isso, o fígado de Clarice é retirado e levado à sala 19, onde também passa por preparo antes do implante em Jandira, às 16h30. Nesse meio tempo, os dois rins e as córneas da faxineira também são extraídos - os primeiros seguiriam para Ribeirão Preto, e as córneas são depositadas no banco de olhos do próprio HB.

Às 17h, o tórax de Clarice começa a ser costurado para depois ser liberado para a funerária e velado. A faxineira nasceu em Ibirá, mas sempre morou em Rio Preto. Morava no Jardim das Oliveiras. Completaria 50 anos ainda nesse mês, no dia 17, e era solteira. Não teve filhos. O velório será em Potirendaba, na casa de uma tia. O enterro está marcado para hoje às 10h.

Até o fechamento desta edição, às 20h30, o transplante de coração não havia terminado, e a perspectiva é de que se estendesse até o fim da noite - os médicos tentavam combater a rejeição do corpo de Olívio ao novo coração. Já o transplante de fígado foi bem-sucedido, segundo o médico Renato Silva. A cirurgia foi concluída às 19h30. “Por ser uma paciente muito grave, superou nossas expectativas”, diz Silva, ao fim de mais uma batalha médica a favor da vida.

Em 3 anos, 53 fígados doados

De 2008 até abril deste ano, o Hospital de Base somou 53 doações de fígado, 385 de córneas, 17 de coração e 289 de rins. A instituição é uma das referências no Estado para transplantes, controlados por uma central instalada em Ribeirão Preto. O HB possui equipe exclusiva para a retirada de órgãos dos doadores. Os médicos são direcionados para, em curto espaço de tempo, fazer com que o órgão seja retirado e chegue até o receptor no menor tempo possível - o procedimento tem de ser realizado rapidamente para garantir o sucesso da operação.

O coração, por exemplo, aguenta apenas seis horas após a retirada; já o fígado e pâncreas, 12 horas, enquanto o rim, 36 horas. O HB também possui estrutura para transplante ósseo, mas, segundo a assessoria de imprensa do hospital, ainda não houve procedimentos do tipo.
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