a partir de maio 2011

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Tudo é Transformação!

  Na verdade, tudo é transformação. Se a matéria transforma-se, em decomposição e se a essência que a habita é matéria, apesar de sutil e de outra natureza, esta também se submete à transformação.
  O nosso corpo já foi bem diferente e limitado em suas funções.
  Hoje, já nos preparamos geneticamente para trazer ao mundo novas formas biológicas, mais resistentes a algumas enfermidades, mais perfeitas na estrutura, e sem deformações. Antecipamo-nos inclusive até à doença.
  O Homem também atravessa esta metamorfose. Já foi mais instintivo, selvagem e precisou sair da caverna para garantir a sobrevivência. Foi morar ao lado dos grandes rios e lagos. Assentando-se, domesticou animais, plantou, demarcou territórios, ergueu as grandes civilizações, como as da Caldeia, da Babilônia, do Egito, da China, ou vestiu a armadura romana para conquistar o velho mundo.
  Já não mais limitado às forças instintivas, foi capaz de criar, manter, produzir, subjugar, criticar e o sentido de responsabilidade aproximou-se, descortinando uma nova maneira de se ver e também ver o mundo. Além do sistema límbico das emoções, conquistou o neocortex. Ele finalmente pensa! Que máximo! E o pior é, quando pensa também que é o máximo... E assim, ele destrói, sem dar-se conta que está promovendo uma transformação por onde passa. Sem consciência, ele serve de instrumento à dor alheia, ao caos e à colheita obrigatória que terá de realizar, enquanto pensa que é Senhor de si para semear. Pura ilusão!
  Ele percebe que quanto maior é a responsabilidade, goza de mais liberdade. Mas desconhece que quanto maior a liberdade, mais contas a prestar à Natureza, ao próximo do uso desta liberdade. Entre o passado que lhe mostra as origens de sua evolução e o futuro tecnológico que se tornou seu presente virtual, fluido, ele moldou a sua vida e isolou-se da relação com o outro. Ele caminha, tropeçando mais do que avançando, mas ainda assim é capaz de vender à celebridades do cinema terrenos até no espaço sideral.
  No entanto, ainda lhe falta muito em matéria de conhecimento, ou deveria dizer, falta-lhe a "essência" do conhecimento, de forma a aplicar em favor daquele que está ao seu lado, e que também se encontra em transformação. Seu Ego estruturado nas matrizes impulsivas de sua infância espiritual permite que lhe escape a compreensão de si e de tudo o que o cerca. Ele machuca, ele adultera, ele mal trata! Embora não seja mais um primata, comporta-se às vezes como tal, ignorando que tais escolhas o levam inevitavelmente no futuro próximo, à falta de escolhas.
  Carece-lhe ainda neste processo, descobrir um sentido, um porque, mas ele quer muitos porquês. Todavia, até agora aqueles que descobriram os porquês não foram felizes. Se viram como reis e rainhas egípcias, nobres da corte de Imperadores romanos, fidalgos medievais e acreditam de forma narcísica que sofrem porque abusaram de suas escolhas em existências passadas, enquanto gozavam de prestígio, riqueza e poder. Porém, ignoram que para o presente que os perturba não há fantasia que os console, haja vista tratar-se de uma transformação multicausal e não unicausal.
  Somos transcendentes, viajores do tempo, semeadores também do agora no sentido existencial. Então por que buscar respostas ilusórias no passado supostamente cármico, se não temos a ciência de nosso presente? Se nos falta na vida atual até mesmo a lembrança de sermos gratos e bons a quem só nos deu amor?
  E assim, agora decepcionado o Homem terá que descobrir sozinho, não mais os porquês da dor, da solidão e da morte, mas "como" irá lidar com essas transformações que sempre foram desprezadas e evitadas por ele. Neste labirinto o Minotauro ainda está vivo e é bom ter cuidado!
  Geralmente, nesta hora de dor existencial, ele foge para as ilusões, e os "anti-isto" e os "anti-aquilo" são os mais procurados, porque anestesiam a consciência.
  Como Dorothy, o Homem busca a estrada de tijolos amarelos que o levará a lugar nenhum. Como Alice, ainda sonha de forma infantil com a rainha de copas a persegui-la, enquanto não percebe que é manipulada pelo coelho. Apenas no fim, ela descobre que somente na loucura do chapeleiro é que desperta para a vida real, quem sabe para o amor real. Mas ele só existe em seus sonhos. Ela não é madura para vivê-lo. Ela recusa transformar-se. Na verdade, Alice é o protótipo da menina-mulher que foge para o mundo da loucura a fim de não tomar suas decisões que a trarão para a realidade.   
  Assim é o Homem Moderno. Quem sabe, sobre nesta hora de contato com a realidade, a maior descoberta, a do sentido da vida, a de entender a finalidade de tudo o que experienciou, mesmo que lhe doa. E se não ocorreu isto ainda, não será questionando, mas vivendo e revivendo, criando, e inventando, se permitindo cair, mas obrigando-se a levantar-se, até que a transformação ocorra, ou melhor, que ela esteja em curso.
  Mas, de qualquer forma é bom ter sempre em mente, ela jamais será completa. O dia de amanhã nunca chegará. Ele é sempre hoje! E o que estamos fazendo para transformar o hoje?
  Ao que tudo indica, se o caminho é o da transformação, e se apenas esta poderosa companheira de viagem nunca abandonou o Homem ao longo desses 150 mil anos de sua existência, talvez o fim seja este, transformar-se. Quem sabe está aí a resposta ao seu porquê, porém este porquê jamais o levará de volta à origem, pois é impossível banhar-se por duas vezes nas mesmas águas de um rio.
  Se a finalidade for a transformação, então não terá fim, não terá acabado, não terá prazo, mas haverá sempre uma finalidade, mesmo que esta seja sem fim. E não há fim... O que há é transformação.
  A dor veio e se foi.
  Algumas vezes ficou que parecia não querer ir embora.
  Alegria fugidia foi tão rápida, que nem deu tempo para perguntar quando ela voltaria.
  A ingratidão corroeu a alma e quebrou as lembranças mais delicadas. Entretanto, a atitude de amor construiu-se inquebrável.
  Porém, em se tratando da cólera, quando esta cessou, deixou a exaustão. A expressão está no olhar que agora saboreia a decepção e a amargura.
  E a mágoa? Tão resistente e teimosa, marcou o frágil corpo, que jamais voltará a ser o mesmo, afinal tudo é transformação.
  Quando se experimenta a juventude, tem-se a ilusão que ela será eterna, mas acaba indo-se precipitadamente, especialmente quando já se sabe da hora marcada para seu fim. Mas ainda sim, houve transformação.
  Já a saudade doeu, doeu... Parecia que não tinha fim, entretanto desapareceu com a presença do amor que acreditou por um tempo que era melhor também ir embora, afastar-se para bem longe, para um lugar em que houvesse apenas ausência. Porém, o que é ausência, senão falta de atitude e lugar preenchido pelo vazio.
  Todos bem sabem que é no egoísmo aonde reina a ausência! E o amor... Só sabe quem o sente, porque se transforma.
  Quem se iludiu e sofre acusando pela sua dor o que chama de amor, correu atrás de fumaças que saem dos bueiros e logo se dispersam pelo mundo... E no fim... O amante terminou algemado a uma idealização.
  Pobre louco que delira! Não se pode pedir-lhe paciência.
  Paciência? Não existe a que dure para sempre, pois "sempre" é um lugar desconhecido e o tempo lá é dominado pela transformação, ou seja, tudo muda! O relógio, os dias, os anos são inúteis para sua permanência. A transformação não os respeita, pelo contrário, usa-os. E os egoístas sabem perfeitamente o que é usar, mas há uma diferença, ele não se deixa mudar, quer aprisionar. Quem precisa de muito tempo é a nossa verdade acovardada, já a maldade em muito pouco deixa seu rastro.
  Igual ao amor, a bondade fecunda, transborda e também, transforma: o fraco renasce forte, o inibido, surge como audacioso, o mesquinho refloresce em gargalhadas de solidariedade.
  Por outro lado, no bairro sombrio da alma humana, lágrimas secam e os mesmos sorrisos não voltam mais, assim como as oportunidades na vida. A janela está vazia, e quem estava ali, cansou e se foi, correu abrindo a porta em busca do sorriso que partiu. Em verdade, acabam por surgir outras lágrimas, outros sorrisos e haverá sempre um egoísta debruçado na janela. Já as oportunidades perdidas ou vividas, nunca mais trarão os mesmos momentos. Se foram... O que finalmente sobrou? 
  Transformação! Enfim, ela foi a única que nunca nos abandonou, nem se permitiu desaparecer. Opera-se na maioria das vezes em silêncio e na solidão, mesmo quando a ignoramos ou não a desejamos. Ela não escolhe cor, raça, crença, se é saudável ou doente, muito menos riqueza ou pobreza. Para ela, "eternidade" não é uma estância no além, é algo a fazer. Não importa quanto tempo leve, ela não chega, porque é, ou melhor, já chegou! E assim esperar por ela é inútil!
  Obedecendo, portanto, a grandiosidade de seu Criador que é imutável, e por isso nunca se transforma, pois se isto ocorresse tudo seria um caos permanente e não uma transformação harmoniosa. Quem não tem harmonia é o Homem, porque luta contra as forças da sua essência e da Natureza.
  Esta foi quem sabe a maior ironia herdada pela criatura humana no momento de sua criação. Nascidos da imutabilidade, somos mutáveis.
  Se pudéssemos ainda aceitar um Deus em sua dimensão antropomórfica, aquele velhinho de barbas brancas acho que Ele teria dito de forma jocosa no instante da nossa criação: "Já que eu não posso, vai tu, criatura, se transformar! Seja o ato constante que guarda a transformação pulsante."
  E assim fomos, e assim somos, seremos, e não deixaremos de ser!
  Mas ainda tem gente que não quer ser...
Por Liszt  Rangel

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