A caridade é um tema central no evangelho de cristo, Jesus
nos ensinou a necessidade da prática da caridade em muitos momentos, como no
exemplo do óbolo da viúva e também na parábola do bom samaritano.
O espiritismo nos recorda os ensinamentos de cristo e
reforça a necessidade da caridade de forma ainda mais enfática, conforme
podemos verificar no capítulo de O Evangelho Segundo o Espiritismo intitulado:
“Fora da caridade não há salvação”.
Sem dúvida, a obrigação de ajudar o próximo em dificuldades
é individual, uma responsabilidade pessoal de cada um de nós no momento em que
nos vemos numa posição em que podemos oferecer socorro a um irmão necessitado,
seja ao nos depararmos com um acidente de transito, numa situação de catástrofe
ou quando oferecemos uma simples palavra de apoio a uma pessoa desesperada. E nos
encontramos no momento vivendo em um mundo material onde todos os espíritos
(apesar de encarnados com a missão de se aperfeiçoarem moralmente) possuem
necessidades materiais e onde devido às imperfeições das instituições humanas, comandadas
por seres ainda imperfeitos, muitos espíritos sofrem devido à falta de recursos
materiais básicos.
Apesar desta responsabilidade individual de praticar a
caridade também se aplicar em relação à caridade material, não temos dúvida de
que a assistência é muito mais eficaz quando praticada de forma
institucionalizada pelo governo. A assistência governamental, sendo derivada de
um direito estabelecido em lei, pode ser praticada de forma muito menos
humilhante para aquele que recebe, que em vez de implorar pode exigir o seu
direito de ver suas necessidades básicas atendidas, necessidades estas que jamais
deixariam de ser atendidas caso ele vivesse em uma sociedade realmente justa.
A assistência governamental instituída pela lei não é fruto
do oportunismo político de dirigentes que desejam fazer caridade com o dinheiro
dos outros, nem fruto de concessão daqueles que possuem mais em favor de uma
classe de “pedidores” oportunistas. A assistência governamental representa na
verdade a vontade coletiva de uma sociedade cristã, que deseja praticar os
princípios cristãos e que são traduzidos pelos legisladores em forma de lei que
garanta condições mínimas de sobrevivência aos mais necessitados.
Mas sendo a sociedade composta por seres humanos ainda
imperfeitos, a assistência governamental sempre se depara com dois problemas: o
egoísmo dos que podem ajudar e não desejam ajudar e o egoísmo daqueles que não
precisam de ajuda (ou precisaram e já não precisa mais) e que querem se
acomodar recebendo esta ajuda.
Então qual a saída? Devemos ou não implementar políticas
assistenciais (contra a vontade de alguns) em favor de pessoas dentre as quais
algumas talvez nem precisem de ajuda?
O discurso contrário às políticas sociais, tanto no Brasil
como em outros países como os EUA, prega que uma sociedade com um forte sistema
de assistência social descambaria rapidamente para a condição de uma nação de
acomodados. Mas os dados obtidos em pesquisas realizadas por instituições
sérias e independentes mostram que as sociedades com sistemas assistenciais
mais fortes são justamente as sociedades mais pacíficas, como os melhores
índices de qualidade de vida e menor propensão para a criminalidade, sendo que
também possuem altos índices de emprego da força de trabalho, ou seja, justamente
o oposto do que pregam as teorias mais pessimistas.
Constatações como estas, confirmadas por todo tipo de
pesquisas, não devem ser surpresa alguma para um cristão consciente de que a solidariedade,
ao contrário do egoísmo, cria sempre um ambiente de cooperação e boa vontade,
seja num círculo pequeno de pessoas ou quando abrange toda uma nação.
Diferentemente do discurso político contrário às ideias de
assistência e solidariedade e que prega a ideia do “cada um por si”, a prática
da assistência mútua dentro das famílias é absolutamente normal, sendo mesmo
uma obrigação, não apenas fornecer esmolas e auxílio mínimo, mas ampla ajuda
financeira para prover a melhor assistência à saúde e a melhor educação
possível, dentre várias outras coisas que pais e filhos em diferentes épocas de
suas vidas fornecem uns aos outros.
É neste ponto que percebemos a incoerência do discurso
individualista, pois os próprios defensores destas ideias são, dentro dos seus
círculos familiares, grandes exemplos da prática da assistência aos
desamparados. O egoísmo predominante em relação à aqueles irmãos que nesta
encarnação não se encontram dentro das relações de parentesco, não subsiste em
relação à aqueles outros irmãos que no momento se encontram dentro da família
consanguínea.
Conforme evolui o homem e a sociedade dos homens, podemos
prever que o egoísmo tende a se enfraquecer e as teorias que pregam a
solidariedade geral tendem a se fortalecer, desta forma a sociedade do futuro
se parecerá cada vez mais com uma família, com responsabilidades e obrigações
morais de ajuda mútua.
Mas, da mesma forma como a ajuda governamental distribuída
sem critério pode se tornar um problema, a ajuda financeira distribuída sem critério
entre membros de uma família pode incentivar a acomodação, a sociedade e as
famílias correm o risco de se tornarem sistemas onde uns se apoiam
indefinidamente sobre os outros. Por isso, devemos tentar criar bons sistemas que
verifiquem as reais necessidades e que incentivem o trabalho, pois a solução
para os desvios de um sistema baseado na solidariedade não pode ser a
destruição do sistema e o prevalecimento do egoísmo e da indiferença. Comparando
as práticas governamentais com as relações familiares, percebemos que as políticas
e leis que tentam diminuir ou impedir o acesso à ajuda governamental aos mais
necessitados, equivalem a leis absurdas que tentassem proibir pais e filhos de
se ajudarem. O discurso enraivecido daqueles que pregam o fim das políticas assistenciais
acaba se parecendo com o discurso daquele pai que abandona a família passando por
necessidades e ainda se revolta contra qualquer tentativa de obriga-lo a arcar
com suas responsabilidades.
Como cristãos, devemos nos guiar pelo amor em cada atitude,
pensamento e opinião que expressamos. Devemos nos vigiar e sempre nos
questionar se determinada ideologia não carrega mais ódio do que amor pelos que
enfrentam dificuldades, se não estamos embarcando numa corrente de pensamento
que é fruto mais do egoísmo do que da verdadeira preocupação pelo futuro dos
nosso irmãos.
Como já foi dito, o modelo perfeito de sociedade existe e é
conhecido de todos, o modelo a ser seguido é o da família. Nas boas famílias, os
bons pais não incentivam a acomodação dos filhos, assim como também, em uma boa
família, bons pais jamais deixam seus entes queridos desamparados.
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