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segunda-feira, 2 de junho de 2014

Cristianismo e assistencialismo


 

A caridade é um tema central no evangelho de cristo, Jesus nos ensinou a necessidade da prática da caridade em muitos momentos, como no exemplo do óbolo da viúva e também na parábola do bom samaritano.

O espiritismo nos recorda os ensinamentos de cristo e reforça a necessidade da caridade de forma ainda mais enfática, conforme podemos verificar no capítulo de O Evangelho Segundo o Espiritismo intitulado: “Fora da caridade não há salvação”.

Sem dúvida, a obrigação de ajudar o próximo em dificuldades é individual, uma responsabilidade pessoal de cada um de nós no momento em que nos vemos numa posição em que podemos oferecer socorro a um irmão necessitado, seja ao nos depararmos com um acidente de transito, numa situação de catástrofe ou quando oferecemos uma simples palavra de apoio a uma pessoa desesperada. E nos encontramos no momento vivendo em um mundo material onde todos os espíritos (apesar de encarnados com a missão de se aperfeiçoarem moralmente) possuem necessidades materiais e onde devido às imperfeições das instituições humanas, comandadas por seres ainda imperfeitos, muitos espíritos sofrem devido à falta de recursos materiais básicos.

Apesar desta responsabilidade individual de praticar a caridade também se aplicar em relação à caridade material, não temos dúvida de que a assistência é muito mais eficaz quando praticada de forma institucionalizada pelo governo. A assistência governamental, sendo derivada de um direito estabelecido em lei, pode ser praticada de forma muito menos humilhante para aquele que recebe, que em vez de implorar pode exigir o seu direito de ver suas necessidades básicas atendidas, necessidades estas que jamais deixariam de ser atendidas caso ele vivesse em uma sociedade realmente justa.

A assistência governamental instituída pela lei não é fruto do oportunismo político de dirigentes que desejam fazer caridade com o dinheiro dos outros, nem fruto de concessão daqueles que possuem mais em favor de uma classe de “pedidores” oportunistas. A assistência governamental representa na verdade a vontade coletiva de uma sociedade cristã, que deseja praticar os princípios cristãos e que são traduzidos pelos legisladores em forma de lei que garanta condições mínimas de sobrevivência aos mais necessitados.

Mas sendo a sociedade composta por seres humanos ainda imperfeitos, a assistência governamental sempre se depara com dois problemas: o egoísmo dos que podem ajudar e não desejam ajudar e o egoísmo daqueles que não precisam de ajuda (ou precisaram e já não precisa mais) e que querem se acomodar recebendo esta ajuda.

Então qual a saída? Devemos ou não implementar políticas assistenciais (contra a vontade de alguns) em favor de pessoas dentre as quais algumas talvez nem precisem de ajuda?

O discurso contrário às políticas sociais, tanto no Brasil como em outros países como os EUA, prega que uma sociedade com um forte sistema de assistência social descambaria rapidamente para a condição de uma nação de acomodados. Mas os dados obtidos em pesquisas realizadas por instituições sérias e independentes mostram que as sociedades com sistemas assistenciais mais fortes são justamente as sociedades mais pacíficas, como os melhores índices de qualidade de vida e menor propensão para a criminalidade, sendo que também possuem altos índices de emprego da força de trabalho, ou seja, justamente o oposto do que pregam as teorias mais pessimistas.

Constatações como estas, confirmadas por todo tipo de pesquisas, não devem ser surpresa alguma para um cristão consciente de que a solidariedade, ao contrário do egoísmo, cria sempre um ambiente de cooperação e boa vontade, seja num círculo pequeno de pessoas ou quando abrange toda uma nação.

Diferentemente do discurso político contrário às ideias de assistência e solidariedade e que prega a ideia do “cada um por si”, a prática da assistência mútua dentro das famílias é absolutamente normal, sendo mesmo uma obrigação, não apenas fornecer esmolas e auxílio mínimo, mas ampla ajuda financeira para prover a melhor assistência à saúde e a melhor educação possível, dentre várias outras coisas que pais e filhos em diferentes épocas de suas vidas fornecem uns aos outros.

É neste ponto que percebemos a incoerência do discurso individualista, pois os próprios defensores destas ideias são, dentro dos seus círculos familiares, grandes exemplos da prática da assistência aos desamparados. O egoísmo predominante em relação à aqueles irmãos que nesta encarnação não se encontram dentro das relações de parentesco, não subsiste em relação à aqueles outros irmãos que no momento se encontram dentro da família consanguínea.

Conforme evolui o homem e a sociedade dos homens, podemos prever que o egoísmo tende a se enfraquecer e as teorias que pregam a solidariedade geral tendem a se fortalecer, desta forma a sociedade do futuro se parecerá cada vez mais com uma família, com responsabilidades e obrigações morais de ajuda mútua. 

Mas, da mesma forma como a ajuda governamental distribuída sem critério pode se tornar um problema, a ajuda financeira distribuída sem critério entre membros de uma família pode incentivar a acomodação, a sociedade e as famílias correm o risco de se tornarem sistemas onde uns se apoiam indefinidamente sobre os outros. Por isso, devemos tentar criar bons sistemas que verifiquem as reais necessidades e que incentivem o trabalho, pois a solução para os desvios de um sistema baseado na solidariedade não pode ser a destruição do sistema e o prevalecimento do egoísmo e da indiferença. Comparando as práticas governamentais com as relações familiares, percebemos que as políticas e leis que tentam diminuir ou impedir o acesso à ajuda governamental aos mais necessitados, equivalem a leis absurdas que tentassem proibir pais e filhos de se ajudarem. O discurso enraivecido daqueles que pregam o fim das políticas assistenciais acaba se parecendo com o discurso daquele pai que abandona a família passando por necessidades e ainda se revolta contra qualquer tentativa de obriga-lo a arcar com suas responsabilidades.

Como cristãos, devemos nos guiar pelo amor em cada atitude, pensamento e opinião que expressamos. Devemos nos vigiar e sempre nos questionar se determinada ideologia não carrega mais ódio do que amor pelos que enfrentam dificuldades, se não estamos embarcando numa corrente de pensamento que é fruto mais do egoísmo do que da verdadeira preocupação pelo futuro dos nosso irmãos.

Como já foi dito, o modelo perfeito de sociedade existe e é conhecido de todos, o modelo a ser seguido é o da família. Nas boas famílias, os bons pais não incentivam a acomodação dos filhos, assim como também, em uma boa família, bons pais jamais deixam seus entes queridos desamparados.

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