a partir de maio 2011

quinta-feira, 12 de abril de 2012

REFLEXÕES CRÍTICAS SOBRE O PERISPÍRITO E SUA INFLUÊNCIA NA FORMAÇÃO E MANUTENÇÃO DO CORPO FÍSICO


Alexandre Fontes da Fonseca, Antonio Cunha Lacerda Leite e Christiano Torchi
 
Grupo de Estudos Avançados Espíritas
Boletim do GEAE
Ano 16 Números 531, 532 e 533 http://www.geae.inf.br/

1. Introdução
  
Uma das questões mais importantes para a Ciência Espírita é o estudo das propriedades e funções do perispírito. A Ciência, que ainda não reconhece sua existência, muito se beneficiaria do estudo do perispírito no desenvolvimento de novos tratamentos para determinadas doenças e na orientação para uma vida mais saudável. Não somente a área médica teria grande proveito no conhecimento do corpo espiritual da criatura, mas as ciências exatas teriam nesse assunto uma área nova para pesquisar, sem embargo das profundas indagações filosóficas que o tema suscita, considerando que ele abre ao pesquisador um novo paradigma para o estudo da origem e da evolução dos seres vivos.

 
O estudo do perispírito não está circunscrito apenas às Obras Básicas da Codificação. Estudiosos como o Dr. Hernani G. Andrade e Dr. Zalmino Zimmermann buscaram aprofundar esses conhecimentos, chegando o primeiro, por exemplo, a propor uma teoria ou modelo para o perispírito, denominado Modelo Organizador Biológico (MOB) [1,2]. Além disso, o Movimento Espírita conta com o trabalho profícuo de Zalmino Zimmermann que apresenta tudo, ou quase tudo, o que já foi estudado e pesquisado a respeito do perispírito [3], uma obra de inestimável valor cultural e científico, de leitura indispensável para todo e qualquer estudioso e pesquisador espírita e  mesmo não-espírita.
 
Neste artigo, propomos um esclarecimento e uma abordagem adicional sobre a influência do perispírito na formação e manutenção do corpo físico do ser humano.Procuraremos estabelecer mais acuradamente, e de acordo com os avanços científicos atuais relacionados com o tema, o valor justo dessa influência em contrapartida aos fatores puramente materiais presentes nesses processos. Basicamente, desejamos mostrar que o perispírito não é um molde mecânico ou rígido do corpo físico, assim como se faz na fabricação de peças de metal ou gesso, nem que sua influência ocorre da mesma forma como no conhecido exemplo da limalha de ferro que se organiza de acordo com as linhas de campo de um ímã. Analisaremos diversas explicações sobre o assunto contidas nas Obras Básicas da Codificação e em outras obras espíritas, para mostrar que os processos de formação e manutenção do corpo físico ocorrem devido a uma interação harmoniosa entre forças puramente materiais e forças espirituais ou psíquicas.
 
Na seção 2, exporemos trechos de A Gênese [4] relacionados com a ação do perispírito sobre a matéria. Na seção 3, analisaremos a idéia de molde associada ao perispírito e na seção 4, examinaremos o Modelo Organizador Biológico. Na seção 5,confrontaremos algumas citações espíritas a respeito da importância dos fatores puramente materiais nos processos de formação e manutenção do corpo físico. Na seção 6, apresentaremos uma proposta qualitativa para a influência do perispírito sobre o corpo físico. Na seção 7, resumiremos a discussão apresentada e tiraremosas conclusões. 
 
2. Ação do perispírito sobre a matéria

 
No item 17 do cap. XI de A Gênese [4], Kardec diz:
   
Pela sua essência espiritual, o Espírito é um ser indefinido, abstrato, que não pode ter ação direta sobre a matéria, sendo-lhe indispensável um intermediário, que é o envoltório fluídico, o qual, de certo modo, faz parte integrante dele.” 

   
Mais adiante, nesse mesmo item, o Codificador acrescenta:
   
Esse envoltório, denominado perispírito, faz de um ser abstrato, do Espírito, um ser concreto, definido, apreensível pelo pensamento. Torna-o apto a atuar sobre a matéria tangível, conforme se dá com todos os fluidos imponderáveis, que são, como se sabe, os mais poderosos motores.
   
É importante destacar a preocupação de Kardec em mostrar o Espírito como um ser que pudesse atuar e interagir com o corpo físico, pois, se isso fosse impossível, não poderíamos associar a responsabilidade de um Espírito aos seus atos como encarnado. Portanto, a possibilidade de influência do Espírito sobre a matéria, por meio do perispírito, é um ponto fundamental no Espiritismo. Resta-nos o trabalho de pesquisa sobre o como essa influência ocorre, o que repercutirá tanto na Ciência como um todo, quanto sobre nossa maneira individual de encarar a vida. Esse trabalho de investigação sobre o corpo espiritual não pertence somente ao Espiritismo e vem sendo realizado por diversas doutrinas e religiões ao longo dos tempos. Acreditamos que a Doutrina Espírita possui elementos para nos ajudar ainda mais no aprofundamento da questão, em ambos os aspectos, científico e filosófico, o que já vem ocorrendo, conforme se pode notar na obra Perispírito [3].
 
Ainda em A Gênese [4], (item 11 do cap. XI), Kardec frisa:
           
Para ser mais exato, é preciso dizer que é o próprio Espírito que modela o seu envoltório e o apropria às suas novas necessidades; aperfeiçoa-o e lhe desenvolve e completa o organismo, à medida que experimenta a necessidade de manifestar novas faculdades; numa palavra, talha-o de acordo com a sua inteligência. Deus lhe fornece os materiais; cabe-lhe a ele empregá-los. É assim que as raças adiantadas têm um organismo ou, se quiserem, um aparelhamento cerebral mais aperfeiçoado do que as raças primitivas. Desse modo igualmente se explica o cunho especial que o caráter do Espírito imprime aos traços da fisionomia e às linhas do corpo.” (Grifos em negrito, nossos). 

  
Inferimos do texto acima que o Espírito modela o corpo por meio do perispírito. Mas como se processaria esse modelamento? Essa é, talvez, uma das questões científicas mais importantes de nosso século, pois a resposta a ela pode significar uma demonstração, em termos dos conceitos das diversas ciências, da sobrevivência da alma. Sabemos, no entanto, o quão difícil ainda é acharmos uma resposta precisa para essa pergunta. Nosso objetivo aqui é procurar algumas pistas que possam ajudar a guiar futuros pesquisadores na busca pela resposta da questão acima. 

    
3. A idéia de molde
 
A idéia de molde foi proposta por diversos estudiosos espíritas, desde a época de Kardec. Essa idéia consiste em propor que o perispírito é um molde para o corpo físico. O conceito de molde é o de algo que se utiliza para dar formas a um material inicialmente amorfo e maleável que, após secar ou esfriar, se torna rígido porém na forma proporcionada pelo molde. É importante destacar que o molde é completo no sentido de que nenhum outro fator externo é necessário para a formação do objeto. Seria o perispírito um molde no mesmo sentido? Neste tópico, vamos analisar essa questão.  

   
Gabriel Delanne, contemporâneo de Kardec, na obra O Espiritismo Perante a Ciência [5] afirma, categoricamente, à p. 246, cap. 2, 4a parte, que o perispírito é o
esboço sobre o qual se modela o corpo humano. O mesmo autor, no livro A Evolução Anímica [6], obra de leitura indispensável, no cap. 1, p. 39, assevera que o perispírito
    
contém o desenho prévio, a lei onipotente que servirá de regra inflexível ao novo organismo, e que lhe assinalará o lugar na escala morfológica, segundo o grau de sua evolução. É no embrião que se executa essa ação diretiva. (...). (Grifos em negritos, nossos).  

   
E no capítulo 4, à página 125-126:
     
A indestrutibilidade e a estabilidade constitucional do perispírito fazem dele o conservador das formas orgânicas; graças a ele, compreendemos que os tecidos possam renovar-se, ocupando os novos o lugar exato dos antigos, e daí amanutenção da forma física, tanto interna como externa.” (Grifos em negrito, nossos). 
   
Ainda Delanne, em “O Fenômeno Espírita” [7], p. 174-175, insiste:

   
Esse perispírito é o molde fluídico no qual se incorpora a matéria durante a vida.(Grifos em negrito, nossos).

 
Léon Denis, fiel companheiro e continuador de Kardec, reporta-se ao perispírito como “forma fluídica original”, “esboço fluídico”; “regulador”; “mediador plástico”; “armadura invisível”, nos livros “Cristianismo e Espiritismo” [8] e “O Grande Enigma” [9].

A seu turno, Emmanuel esclarece, na obra “Roteiro” [10], p. 31, cap. 6: 
 
O perispírito é, ainda, corpo organizado que, representando o molde fundamental da existência para o homem, subsiste além do sepulcro, demorando-se na região que lhe é própria...” (Grifos em negrito, nossos).
 
Essas colocações se baseiam em determinados fenômenos fisiológicos como a diferenciação das células no processo de crescimento do embrião, a regeneração de determinados tecidos e a manutenção da forma física. A idéia de molde é excelente para explicar esses fenômenos fisiológicos, contudo, podemos identificar algumas questões para as quais a idéia de molde não traz solução definitiva.
   
Sabemos, pela Ciência, que os seres vivos seguiram um processo evolutivo a partir de seres mais simples em organização para seres mais complexos e ricos, culminando com o surgimento do ser humano. Kardec tinha conhecimento disso e no item 15 do cap. XI de A Gênese, assim se expressa: 

   
Da semelhança, que há, de formas exteriores entre o corpo do homem e o do macaco, concluíram alguns fisiologistas que o primeiro é apenas uma transformação do segundo. Nada aí há de impossível, nem o que, se assim for, afete a dignidade do homem. Bem pode dar-se que corpos de macaco tenham servido de vestidura aos primeiros Espíritos humanos, forçosamente pouco adiantados, que viessem a encarnar na Terra, (...).
   
Porém, sabemos que esse processo evolutivo não ocorreu em dias ou meses, mas em milhares de anos. Qualquer melhoramento na raça humana se processou de modo muito mais lento do que a idéia de um molde rígido poderia sugerir.
 
Uma outra questão que não pode se explicada pela idéia de molde advém da questão 356 de O Livro dos Espíritos [11]:
   
356. Entre os natimortos alguns haverá que não tenham sido destinados à encarnação de Espíritos ?
 Alguns há, efetivamente, a cujos corpos nunca nenhum Espírito esteve destinado. Nada tinha que se efetuar para eles. Tais crianças então só vêm por seus pais.
   
Se é possível que um corpo de bebê se forme sem a presença de um Espírito ligadoàquele, então o que serviu de molde para ele? O perispírito da mãe não poderia ser um molde no sentido da palavra. Desse exemplo inferimos que talvez a idéia da influência do perispírito sobre o corpo físico não esteja bem representada pelo conceito de molde.

Podemos citar, também, o caso Segismundo, presente no livro Missionários da Luz[12]. No capítulo 14, por exemplo, André Luiz narra a atuação dos “Construtores” (uma equipe de Espíritos responsável pela formação do novo feto) nos primeiros 21 dias após a ligação do perispírito de Segismundo ao embrião. Sem deixar de haver a influência do perispírito de Segismundo na formação do feto, os “
Construtores” agem sobre as células em formação “para que a reencarnação, por vezes tão dificilmente projetada e elaborada, não venha a falhar, de início, por falta de colaboração de nosso plano, onde são tomados os compromissos
”, disse o chefe dos “Construtores”.

Se existe o risco de prejuízo no processo inicial de formação do feto a ponto de, em casos onde há merecimento, a Espiritualidade intervir para que nada dê errado, então concluímos que o perispírito, sozinho, não garante sucesso absoluto na formação do novo corpo. Isso nos mostra, mais uma vez, que a idéia de molde ainda é insuficiente para descrever, em caráter definitivo, a influência do perispírito sobre o corpo físico. 
 


4. Idéia do Modelo Organizador Biológico (MOB)

 

Hernani G. Andrade talvez tenha sido pioneiro na formulação de uma teoria para o perispírito, com base em conceitos da Física. Ao que nos consta, foi ele quem cunhou a expressão “Modelo Organizador Biológico” (MOB) [1,2], que seria “uma unidade autônoma e evolutiva, capaz de interagir com a matéria orgânica e, desse fato, resultar o ser biológico” [2].
 
Entre suas características principais, o MOB seria portador de um campo biomagnético capaz de interagir com a matéria. O MOB teria uma função que se espera de um molde, porém ele não seria algo rígido e estático e pode evoluir adquirindo novas propriedades de acordo com a evolução moral do ser.
 
Uma característica importante do MOB é a capacidade de organizar a matéria viva. O campo biomagnético seria responsável por influenciar o corpo físico em sua formação e manutenção e é sugerido que isso ocorra de modo análogo à organização de punhado de limalha de ferro sob ação de um campo magnético comum.
 
De fato, os sistemas vivos são considerados sistemas auto-organizados. Porém, apesar da complexidade, ainda não existe uma demonstração absoluta de que a vida decorre apenas das interações puramente materiais entre as partículas que compõem o corpo físico. Entretanto, o Prof. Ilya Prigogine, prêmio Nobel de Química em 1977, formulou a teoria da Termodinâmica de Processos Irreversíveis [13], em que ele mostra as condições para a existência de sistemas auto-organizados. Essa teoria é um forte argumento dos materialistas para a não existência do Espírito ou de um MOB, responsável pela formação e manutenção do corpo físico.
 
A primeira dificuldade desse modelo é que, se por hipótese o MOB possui um campo biomagnético capaz de interagir com a matéria, teria que ser possível medi-lo com instrumentos terrestres. A teoria do “Psi Quântico” [14] é muito qualitativa e ainda precisa ser melhor analisada em vista de algumas críticas [15]. Até o momento, o que se sabe, por exemplo, da bioeletrografia (ou fotos Kirlian) é que ela expressa apenas o chamado efeito corona, que é a radiação emitida pelos elétrons do objeto perante os altos campos eletromagnéticos produzidos pelo aparelho Kirlian. Em outras palavras, ainda não se consegue detectar a existência de um campo cuja causa não possa ser explicada por nenhum fenômeno físico normal.
 
Uma outra dificuldade do MOB, porém não absoluta, decorre das heranças genéticas. Se o modelo é organizador num sentido absoluto, como os fatores hereditários surgem na formação do novo corpo? A própria semelhança física entre pais, avós e filhos sugere que fatores materiais preponderam em determinadas partes da formação do corpo físico. Aliás, a idéia de molde discutida na seção anterior também não explica a origem dessa semelhança. O instrutor Alexandre, em Missionários da Luz [12], no capítulo 13, diz que “Os contornos e minúcias anatômicas vão desenvolver-se de acordo com os princípios de equilíbrio e com a lei da hereditariedade. A forma física futura de nosso amigo Segismundodependerá dos cromossomos paternos e maternos; adicione porém, (...), a influência dos moldes mentais de Raquel, a atuação do próprio interessado, o concurso dos Espíritos Construtores, que agirão como funcionários da natureza divina (...).” (Grifos em negrito, nossos).
 
Percebemos, portanto, que a própria Espiritualidade nos informa que os fatores materiais não podem ser negligenciados.
 
A situação apresentada na questão 356 de O Livro dos Espíritos também mostra que é possível formar um corpo físico sem a presença do perispírito ou, no caso, do MOB.
 
É importante mencionar a seguinte afirmativa do referido instrutor, ainda no capítulo 13 da obra referida: “O organismo maternal fornecerá todo o alimento para a organização básica do aparelho físico, enquanto a forma reduzida de Segismundo, como vigoroso modelo, atuará como imã entre limalhas de ferro, dando forma consistente à sua futura manifestação no cenário da Crosta.” (Grifos em negrito, nossos). 
 
Destacamos a palavra “como” na citação acima, para enfatizar que o processo de influência do perispírito sobre a matéria é semelhante à atuação de um imã sobre limalha de ferro, porém não é exatamente o mesmo processo. Como elucidamos acima, para que esse processo de influência seja do mesmo jeito que a influência de campos magnéticos sobre objetos metálicos, seria preciso medir tais campos magnéticos e mostrar que sua causa não esteja na própria organização da matéria.
 
Por essas razões, nós ponderamos que a influência do perispírito sobre o corpo físico ainda não seja totalmente bem representada pela idéia de um modelo organizador em fenômeno totalmente análogo ao de um campo magnético atuando sobre a limalha de ferro. Adiante, exporemos uma proposta que pode conciliar a possibilidade de influência do perispírito com as características científicas dos sistemas vivos.
 
5. A influência dos fatores puramente materiais

A semelhança entre avós, pais e filhos sugere que fatores puramente materiais dirijam o processo de formação do corpo físico. Certamente, que isso ocorre em muitos outros aspectos além da semelhança física.

André Luiz, na obra Evolução em Dois Mundos [16], explica que o automatismo presente em diversas funções fisiológicas como, por exemplo, as funções vegetativas do nosso corpo, é o resultado do acúmulo de experiências do princípio inteligente no seu corpo espiritual, através dos séculos. Entretanto, no cap. IV, ele ressalva que:

(...), em qualquer estudo acerca do corpo espiritual, não podemos esquecer a função preponderante do automatismo e da herança na formação da individualidade responsável, para compreendermos a inexeqüibilidade de qualquer separação entre a Fisiologia e a Psicologia, (...).”(Grifos em negrito, nossos).

Essa afirmativa de André Luiz é clara no sentido de que não se deve excluir os fatores materiais em todos os processos biológicos, assim como não se deve excluir os fatores espirituais. A citação feita na seção 4, do livro Missionários da Luz, reforça isso. O próprio Hernani G. Andrade reconhece (p. 51 de [2]) que:

“Se admitíssimos, (...), a existência de estruturas de campo pré-existentes e ligadas aos processos biológicos, talvez pudéssemos, reforçando as teorias evolucionistas, dar-lhes melhor explicação, sem ferir os bem firmados princípios da genética. (...) O fenômeno ao qual denominamos vida resultaria, segundo uns, exclusivamente das propriedades físico-químicas da matéria. Mas, segundo este outro ponto-de-vista, ele se originaria da conjugação de duas categorias de fatores: as propriedades físico-químicas da matéria e um modelo organizador biológico (MOB).” (Grifos em negritos nossos).

Percebe-se, portanto, que André Luiz e Hernani não desprezam os fatores materiais na formação e manutenção do corpo físico.
6. Modelo Influenciador Biológico (MIB) 
 
Diante da análise realizada até o momento, gostaríamos de fazer uma proposta qualitativa para a ação do perispírito sobre a matéria.
 
Notem que não estamos afirmando que somente os fatores materiais são importantes. Está claro, pelas citações acima, que fatores materiais e espirituais conjuntamente determinam a formação e manutenção do corpo físico. Enfatizamos que os fatores materiais não devem ser negligenciados numa proposta para os mecanismos de ação do perispírito sobre a matéria.
 
O MOB, proposto por Andrade, tenta fazer isso, ao desenvolver a idéia do campo biomagnético que interagiria com o corpo físico. Porém, a forma pela qual essa interação ocorreria necessita da demonstração da existência de campos por ora ainda não medidos pela Ciência. O MOB ainda não leva em conta o caráter complexo dos sistemas vivos, de acordo com os conhecimentos da Ciência que prediz a possibilidade de existência de sistemas auto-organizados.
 
Propomos, então, a idéia de um Modelo Influenciador Biológico (MIB) para o perispírito. O MIB seria análogo ao MOB, exceto no fato de que ele não dirigiria a formação da matéria da mesma maneira que um campo magnético organiza a limalha de ferro. A palavra “influenciador” deve ser entendida no sentido científico de ser um elemento que gera uma pequena influência (ou uma pequena perturbação em termos científicos) no sistema material. Segundo a teoria do Caos [17], pequenas perturbaçõesou influências, podem levar a grandes alterações no sistema material como um todo. Através dessas pequenas influências, um sistema complexo como um ser vivo pode ser formado e mantido sem que o controle dessa formação requeira o gasto de muita energia. Isso significa que tais pequenas influências não requerem que a intensidade do campo biomagnético, que vai interagir com a matéria, seja grande.
 
Essa idéia resolve todos os problemas apresentados até aqui: i) nossa proposta não despreza a ação das leis físico-químicas que regem o funcionamento do corpo físico; ii) permite que o Espírito atue sobre o corpo físico sem necessitar um campo biomagnético de grande intensidade (diferente da limalha de ferro que precisa de um campo relativamente forte ou significativo para se organizar sobre uma superfície); e iii) não diminui nenhuma das propriedades e funções organizadoras do perispírito, pois é a característica complexa dos sistemas vivos que os tornam até certo ponto maleáveis e dirigíveis, perante influências de intensidade pequena ou sutil.
 
No modelo MIB, portanto, o campo biomagnético seria de intensidade pequena e, por isso, demasiadamente sutil para ser medido com os aparelhos usuais. Entretanto, algumas pesquisas indicam a existência de campos elétricos de baixa intensidade ainda não explicados pela Ciência. Em nota de rodapé do capítulo I da obra Perispírito, o Dr. Zalmino Zimmermann traz a lume a seguinte notícia:
 
O cientista norte-americano, HAROLD SAXTON BURR, com sua equipe de colaboradores, investigando, durante mais de 30 anos, os campos elétricos em estruturas biológicas, verificou, através de minuciosas e delicadas medições, a existência de campos elétricos quepareciam presidir às diferentes funções biológicas de todos os seres vivos, desde os seus componentes biomoleculares, celulares, citológicos e glandulares. Segundo a sua conclusão, esses campos se estruturam no estilo de uma organização hierárquica, evidenciando que ‘não são resultantes funcionais, mas sim, determinantes das funções peculiares aos organismos, isto é, formam uma estrutura que governa e mantém a organicidade do ser vivo! (conf. ANDREA, Jorge. ‘Psicologia Espírita’, 6ª ed., Rio: LORENZ, 1994, p. 31).
  
Tais campos eletrodinâmicos foram denominados ‘campos de vida’ (fields of life) e, segundo BURR – professor emérito de Anatomia, da Escola de Medicina da Universidade de Yale –, todos os seres, ‘do homem ao rato, das árvores às sementes’, são por eles ‘moldados e controlados’, podendo, inclusive, ‘ser medidos e localizados por meio de modernos voltímetros’. Como os campos da Física - afiança o cientista - possuem qualidades organizadoras e diretoras que foram reveladas por muitos milhares de experimentos’. (BURR, H. S. ‘Blueprint of Immortality’. Londres, NEVILLE SPEARMAN, 1971, pp. 11 e 12. Cf. ANDRADE, Hernani Guimarães. ‘Espírito, Perispírito e Alma – Ensaio sobre o Modelo Organizador Biológico’. 10ª ed., S. Paulo: PENSAMENTO, 1984, p. 7).” (Grifos nossos).


Certamente, esses campos são de intensidade pequena, o que reforçaria uma tese de influência do perispírito sobre a matéria que se baseasse em campos sutis. Isso não deve ser tomado como comprovação da proposta de um MIB. Na verdade, estamos apenas propondo uma mudança qualitativa na idéia do Modelo Organizador Biológico de modo a conciliar as características científicas que se conhecem hoje sobre os sistemas vivos e a possibilidade de ação do perispírito sobre a matéria.
 
7. Conclusões 
 
Neste artigo, revisamos os modelos existentes para o perispírito e seu possível mecanismo de ação sobre a matéria. Analisamos as idéias de molde e o Modelo Organizador Biológico, mostrando que tais idéias, conquanto satisfatórias em determinados aspectos, ainda são insuficientes para explicar todas as propriedades e características do fenômeno de formação e manutenção do corpo físico.
 
O fato de fazermos uma crítica construtiva dos modelos anteriores não desmerece o trabalho de pesquisa realizado por seus autores. Muito pelo contrário, tornam-nos ainda mais valorosos no aspecto científico. A história da Ciência mostra como os conceitos modernos foram construídos com base nos conceitos anteriores, e a Ciência Espírita deve aproveitar isso no seu desenvolvimento.
 
Propomos que o perispírito seja um Modelo Influenciador Biológico (MIB), em que, através de pequenas influências sobre a matéria, o perispírito poderia formar e manter o corpo físico sem a necessidade de exercer essa atuação por intermédio de campos físicos de intensidade elevada. Mostramos que essa idéia concilia o fato de o perispírito poder atuar sobre o corpo físico com a necessidade de essa atuação ser de natureza sutil, já que não se consegue medir, com os instrumentos atuais, a presença do perispírito.
 
Enfatizamos que o MIB é uma proposta ainda qualitativa para o perispírito. Dentro desse modelo, falta desenvolver as características do campo (magnético ou elétrico) que atuaria sobre a matéria, bem como teremos que desenvolver um modelo físico para essa atuação.
 
Para encerrar, reportamo-nos à advertência do Espírito LAMMENAIS, reproduzida à p. 72 de O Livro dos Médiuns [18], no cap. IV, item 51, “Dos Sistemas”:
 
Agora o ponto de vista científico, ou seja: a essência mesma do PERISPÍRITOIsso é outra questão. Compreendei primeiro moralmente. Resta apenas uma discussão sobre anatureza dos fluidos, coisa por ora inexplicável. A Ciência ainda não sabe bastante, porém lá chegará, se quiser caminhar com o EspiritismoO perispírito pode variar e mudar ao infinito. A alma é o pensamento: não muda de natureza. Não vades mais longe, por este lado; trata-se de um ponto que não pode ser explicado. Supondes que, como vós, também eu não perquiro? Vós pesquisais o PERISPÍRITO; nós outros, agora, pesquisamos aALMA. Esperai, pois.” — Lamennais. (Grifos nossos).

 
Lamennais deixa claro que cabe a nós, encarnados, o trabalho de pesquisa e que a busca pelo conhecimento não pára nunca.
 
Referências  
[1] H. G. Andrade, Espírito, Perispírito e Alma, Ed. Pensamento, São Paulo (1984).
[2] H. G. Andrade, A Matéria Psi, Casa Editora O Clarim, Matão (1971).
[3] Z. Zimmermann, Perispírito, Departamento Editorial do Centro Espírita Allan Kardec (2000).
[4] A. Kardec, A Gênese, Ed. FEB, 36ª edição, Rio de Janeiro (1995).
[5] G. Delanne, O Espiritismo Perante a Ciência, Ed. FEB, 3edição, Rio de Janeiro (1995).
[6] G. Delanne,  A Evolução Anímica, Ed. FEB, 3edição, Rio de Janeiro (1992).
[7] G. Delanne, O Fenômeno Espírita, Ed. FEB, 4a edição, Rio de Janeiro (1988).
[8] L. Denis, Cristianismo e EspiritismoEd. FEB, 10a edição, Rio de Janeiro (1994).
[9] L. Denis, O Grande Enigma, Ed. FEB, 10edição, Rio de Janeiro (1992).
[10] Emmanuel, psicografia de F. C. Xavier, Roteiro, Ed. FEB, 9ª edição, Rio de Janeiro (1982).
[11] A. Kardec, O Livro dos Espíritos, Ed. Feb, 76ª edição, Rio de Janeiro (1995).
[12] A. Luiz, psicografia de F. C. Xavier, Missionários da Luz, Ed. FEB, 26ª edição, Rio de Janeiro (1995). 
[13] I. Prigogine, Nonequilibrium Statistical Mechanics, Ed. Wiley-Interscience, New York (1962). 

[14] H. G. Andrade, Psi Quântico, Uma Extensão dos Conceitos Quânticos e Atômicos à Idéia do Espírito, Ed. Pensamento, 9ª edição, São Paulo (1993).
[15] C. A. Appoloni, A propósito da matéria psi, Núcleo Espírita Universitário NEU – Londrina, http://www.neudelondrina.org.br/artcientificos_capa.htm
[16] A. Luiz, psicografia de F. C. Xavier, Evolução em Dois Mundos, Ed. FEB, 11ª edição, Rio de Janeiro (1989).
[17] A. F. Da Fonseca, Caos, Complexidade e a Influência dos Espíritos sobre a Natureza, Revista FidelidadEspírita 12, p. 20 (2003).
[18] A. Kardec, O Livro dos Médiuns, Ed. FEB, 62ª edição, Rio de Janeiro (1996).


 
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